sexta-feira, 20 de novembro de 2009

AS CRUZADAS

Editado de postagem do site: http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/

Nos séculos XII e XIII, a Europa cristã empenhou-se numa vasta campanha contra o mundo muçulmano, para recuperar os lugares santos e assegurar o controle das rotas de peregrinação. Essas expedições bélicas, as cruzadas, contribuíram para o fomento do comércio e da navegação no Mediterrâneo e para a ascensão da burguesia na Europa.
No consenso geral, houve oito grandes cruzadas, empreendidas pelos reinos cristãos e quase sempre também pelo papado. Além dessas, registraram-se alguns movimentos de menor alcance, mas com as mesmas características das cruzadas.

ANTECEDENTES: Depois do ano 1000, ocorreu na Europa um crescimento demográfico, comercial e cultural que abalou os alicerces das instituições medievais. Todavia, o continente mantinha-se aferrado ao sistema feudal e as guerras proliferavam entre reinos e feudos, criando um clima geral de insegurança. No início da primeira cruzada, em fins do século XI, a Inglaterra ainda sofria as conseqüências da conquista normanda de 1066, a Espanha estava em pleno processo de Reconquista e a Alemanha enfrentava numerosas lutas internas e disputas com Roma. Por isso, esses três grandes países não participaram logo das cruzadas, cuja base principal foi a França.
Entretanto, todas essas nações passavam por processos sociais semelhantes. A expansão demográfica que começara no século anterior deixara desocupados muitos jovens da nobreza, que, não sendo primogênitos, se viam excluídos da herança de propriedades e, assim, eram tentados pela aventura. Por outro lado, a crescente atividade econômica impelia a Europa a disputar com o Islã o domínio do Mediterrâneo. Com a enorme concentração de poder nas mãos da igreja, o papado podia empreender grandes iniciativas de expansão religiosa. Todos esses fatores levaram a Europa a realizar uma série de custosas guerras santas contra o mundo muçulmano, que naquela época atravessava um período de grande instabilidade.
As tribos turcas, originárias do interior da Ásia, se haviam lançado à conquista do oeste, comprometendo o califado abássida de Bagdá no século XI. A veemência desse ímpeto produziria um choque multissecular com o Ocidente cristão.
O profundo sentimento religioso da cristandade medieval não teve paralelo. A devoção popular se traduzia em movimentos coletivos de crítica aos religiosos, que, por sua vez, exortavam os fiéis a acabar com os conflitos internos ou externos, ou a proteger a comunidade dos perigos dessas lutas. Tanto assim que as cruzadas tiveram uma de suas origens nas associações locais empenhadas em suprimir os conflitos feudais (trégua e paz de Deus) e em garantir a segurança dos peregrinos que viajavam para cidades européias de grande fé cristã, como Roma ou Santiago de Compostela. No Concílio de Clermont, em 1095, a proteção eclesiástica se estendeu aos peregrinos que viajavam para Jerusalém, e pela primeira vez lançou-se a idéia de uma campanha contra os infiéis. O ideal da cruzada, portanto, englobava ao mesmo tempo a aspiração de que a paz reinasse entre os cristãos e a exortação contra os muçulmanos, em cujas mãos se encontravam os lugares santos.
O espírito religioso da época fortaleceu-se com o temor generalizado do fim do mundo, provocado pelo início do segundo milênio.
Em fins do século XI, o império bizantino se ressentia dos violentos e crescentes golpes infligidos pelos novos conquistadores turcos. O imperador bizantino Aleixo I solicitou a ajuda da cristandade ocidental, que logo se dispôs a prestá-la.

PRIMEIRA CRUZADA

O Concílio de Clermont, inaugurado pelo papa Urbano II em novembro de 1095, incluiu entre suas decisões a de conceder o perdão de todos os pecados - isto é, a indulgência plena - aos que fossem ao Oriente para defender os peregrinos, cujas viagens tornavam-se cada vez mais perigosas. A repercussão popular da medida tornou-se patente quando o papa, ao anunciá-la, foi aclamado por uma multidão. Ao grito de "Deus o quer", que logo se propagou pela Europa, numerosos franceses de todas as camadas sociais vestiram um uniforme que ostentava uma grande cruz e que deu o nome aos guerreiros. O entusiasmo foi de tal ordem que muitos venderam ou hipotecaram todos os seus bens para obter as armas e o dinheiro necessários.
As camadas mais humildes da população criaram sua própria força, a chamada "cruzada do povo", que, formada em torno do pregador Pedro o Eremita, atravessou a Hungria e a Bulgária, provocando a sua passagem grandes abusos e desordens. Dizimados em parte pelos búlgaros, esses cruzados foram expulsos de Constantinopla em 1096 e acabaram sendo aniquilados pelos turcos. Outros grupos, sobretudo alemães, que se aproveitaram da expedição para massacrar judeus, sequer obtiveram permissão para atravessar as fronteiras bizantinas.
O imperador bizantino exigiu dos chefes militares estrangeiros que jurassem resgatar os territórios arrebatados ao império pelos turcos e que também lhe entregassem todas as novas terras conquistadas, com o que os cruzados concordaram.
Depois de conquistarem Nicéia e Antióquia, os cruzados rumaram para Jerusalém, que se achava nos domínios dos califas fatímidas do Cairo. O exército cristão ficara reduzido a cerca de 1.500 cavaleiros e 12.000 soldados, carentes de armas e provisões. Jerusalém foi conquistada três anos depois do começo da primeira cruzada a um custo jamais imaginado pela cristandade ocidental. A conquista foi seguida de um massacre de muçulmanos e judeus -- homens, mulheres e crianças.
Balduíno foi proclamado rei de Jerusalém (novembro de 1100), inaugurando-se assim o primeiro dos reinos cristãos que se instalariam na Terra Santa em conseqüência das cruzadas. Também criaram-se os condados de Edessa e Trípoli e o principado de Antioquia.

Segunda cruzada

Os estados cristãos do Oriente foram continuamente fustigados pelos turcos e, quando estes tomaram Edessa em 1144, o papa Eugênio III achou que já era hora de empreender uma segunda cruzada e convocou-a por uma bula especial em 1145. Também dessa vez a França apoiou ativamente o projeto, do qual participaram seu rei, Luís VII, e o imperador alemão, Conrado III, junto com Frederico da Suábia, herdeiro do império germânico, e os reis da Polônia e da Boêmia.
Em março de 1148, os franceses chegaram à Antioquia e pouco depois dirigiram-se para Jerusalém, onde decidiram atacar Damasco com seus cinqüenta mil soldados. A iniciativa fracassou em 28 de julho de 1148, quando, depois de cinco dias de assédio, ficou evidente que a cidade era inexpugnável. Ali terminou a segunda cruzada.

Terceira cruzada

Os 25 anos seguintes foram para os estados cristãos do Oriente uma época de graves perigos e lutas intestinas. Nesse período, tais estados também se desenvolveram muito. No século XIII redigiu-se o código denominado Assises de Jérusalem (Fundamentos do Reino de Jerusalém), que estabelecia o sistema feudal na região. Duas ordens militares cristãs, a dos cavaleiros de São João de Jerusalém e a dos templários, aumentaram seu poderio nesses reinos. A igreja ficou completamente latinizada, e consolidou-se uma população oriunda de quase todos os países da Europa.
As disputas entre os estados cruzados e a ameaça do sultão Saladino, que se apoderou de Jerusalém em outubro de 1187, levaram o papa Gregório VIII a lançar outra cruzada, à qual imediatamente se associaram o rei Guilherme II da Sicília, o imperador alemão Frederico I Barba-Roxa, os reis Filipe Augusto II da França e Henrique II da Inglaterra, que morreu pouco depois, sendo substituído por Ricardo I Coração de Leão. O rei francês alcançou Acre em abril de 1191 e em junho chegou Ricardo. Decorrido um mês de assédio, os cruzados tomaram a praça. Filipe voltou à França e Ricardo seguiu para Jerusalém. Ainda em 1191, em Arsuf, derrotou as forças muçulmanas e ocupou novamente Jaffa. Ricardo retornou à Europa sem jamais haver entrado na cidade santa. Com isso terminou a terceira cruzada, que, embora não tenha conseguido recuperar Jerusalém, consolidou os estados cristãos do Oriente.

Quarta cruzada

O impulso para o quarto movimento cruzado veio do papa Inocêncio III, que desde 1198 exortava a cristandade a empreender uma nova expedição. O pedido do papa repercutiu muito entre os nobres. Decidiu-se que o transporte dos exércitos ficaria a cargo de Veneza, cujas relações com Constantinopla eram das mais tensas. O ressentimento dos bizantinos contra os privilégios comerciais de que a cidade italiana desfrutava no império já resultara num massacre de venezianos em 1182.
Esse conflito acabou mudando os rumos da quarta cruzada. O objetivo do papa era destruir a potência islâmica do Egito; mas para Veneza, que mantinha boas relações comerciais com esse país, tratava-se de conquistar Constantinopla. Assim, constatado que o exército cruzado não dispunha de recursos para pagar pela travessia, as autoridades venezianas negociaram com os cruzados para que estes as ajudassem a conquistar a cidade cristã de Zara (Império Bizantino), na costa da Dalmácia, o que foi aceito. Zara caiu em novembro de 1202, apesar dos protestos do papa. A cruzada se tornara uma simples guerra secular.
Em 13 de abril de 1204, os cruzados entraram na capital (Constantinopla), que sofreu três dias de pilhagens e massacres. Em seguida, os cruzados dividiram entre si os despojos do império. Estabeleceram-se um reino bizantino em Epiro e diversos principados latinos na Grécia, como o ducado de Atenas e o principado de Moréia.

Quinta cruzada

O papa Honório III conseguiu, durante o IV Concílio de Latrão, em 1215, adesões para uma nova expedição.
Em fevereiro de 1219, os muçulmanos negociaram uma paz que incluía a cessão da própria Jerusalém aos cristãos. Pelágio (cardeal do clero católico) preferiu rejeitar a excelente oferta, pois estava certo de que os muçulmanos não poderiam resistir aos cruzados, quando Frederico II chegasse. Damietta caiu em novembro de 1219, mas o atraso das tropas alemãs estancou o avanço dos cruzados. Em julho de 1221, o cardeal ordenou uma ofensiva contra o Cairo que fracassou e, depois, teve de aceitar uma trégua de oito anos. Essa foi a última cruzada para a qual o papado mandou suas próprias tropas.

Sexta cruzada

O imperador Frederico II iniciou a sexta cruzada em 1227. Depois que sua frota partiu, o imperador recebeu uma missão de paz do sultão do Egito, mas o papa Gregório IX excomungou-o por ele ter demorado a se engajar na luta. Finalmente, Frederico zarpou no verão de 1228; mas tanto em Chipre como em Acre suas pretensões foram baldadas, sobretudo em virtude de sua excomunhão. Apoiado apenas pelos cavaleiros teutônicos e por suas minguadas tropas, Frederico conseguiu, no entanto, selar um acordo vantajoso com os egípcios em 1229. O reino de Jerusalém recebia a cidade santa, Belém, e um corredor para o mar, e firmava-se uma trégua de dez anos. Frederico foi coroado rei de Jerusalém e, de volta à Europa, reconciliou-se com o papa em 1230.

Sétima cruzada

Expirados os dez anos da trégua, uma nova cruzada, com poucos homens e poucos recursos, liderada por Ricardo de Cornualha e Teobaldo IV de Champanhe, não pôde impedir que, em 1244, Jerusalém caísse nas mãos dos turcos. Mas no ano seguinte, quando o papa Inocêncio IV abriu o Concílio de Lyon, o rei da França, Luís IX, expressou o desejo de ajudar os cristãos do Oriente. Luís IX levou três anos para embarcar, mas o fez com um respeitável exército de 35.000 homens. A expedição chegou a Chipre em setembro de 1248, como escala para o Egito. Em junho de 1249, Damietta foi recuperada para os cristãos e a cidade do Cairo esteve a ponto de cair em fevereiro de 1250. Os muçulmanos lograram interceptar o envio de provisões destinadas aos cruzados e Luís, diante da fome e das enfermidades que afligiam sua tropa, resolveu bater em retirada, mas foi feito prisioneiro. Libertado em troca do pagamento de um resgate em maio de 1250, permaneceu no Oriente até 1254, quando conseguiu a entrega dos demais prisioneiros.

ÚLTIMAS CRUZADAS

Em 1265, os egípcios da dinastia mameluca tomaram Cesaréia, Haifa e Arsuf; em 1266, ocuparam a Galiléia e parte da Armênia e, em 1268, conquistaram Antioquia. O rei Luís IX lançou nova cruzada em 1270, que seria a oitava, mas não encontrou muito eco na Europa. Dessa vez, rumou para Túnis, mas a expedição acabou em tragédia: a peste ceifou o próprio rei e um de seus filhos, além de muitos cruzados.
Desde então os estados cristãos do Oriente ficaram à mercê do destino, pois extinguiu-se na Europa o espírito que tinha animado as cruzadas. Muitos fatores concorreram para esse desgaste. Os exércitos europeus tinham-se convertido em milícias profissionais e os cavaleiros encontravam nelas uma ocupação permanente, sem necessidade de recorrer a aventuras no exterior. Os recursos financeiros absorvidos pelas cruzadas achavam agora melhor emprego no próprio continente. A igreja, motriz principal dessas campanhas, perdera muito de seu prestígio e não ousava arriscar novas campanhas.
Os estados cristãos no Oriente foram-se extinguindo um após outro. O de Jerusalém se desintegrou com as lutas entre os nobres cristãos. Os castelos dos cruzados foram sucessivamente destruídos.
As ordens militares também abandonaram a Palestina e com elas desapareceram as únicas forças organizadas que se opunham ao Islã.
Os turcos já não encontraram obstáculos de monta para suprimir o império bizantino, quando finalmente caiu, em meados do século XV, se reduzira a um pálido reflexo do que fora.

SIGNIFICADO HISTÓRICO

Embora não significassem um triunfo militar, as cruzadas exerceram poderosa influência na Europa ocidental. A rude cultura do Ocidente enriqueceu-se pelo contato com a do Oriente; desenvolveu-se o conhecimento da ciência e da filosofia greco-islamita; e adquiriram-se novas técnicas de combate. Reunidos em grandes massas que falavam uma linguagem comum ou dialetos relacionados, os cruzados fizeram contato com diferentes culturas e línguas, estabelecendo-se lembranças e tradições comuns que alimentaram o nacionalismo crescente.
As cruzadas contribuíram para o enfraquecimento parcial do feudalismo. Muitos senhores morreram ou, endividados, empobreceram gradualmente; outros fixaram-se no Oriente, disto se aproveitando o poder real, sobretudo na França, para destruir a independência política dos senhores feudais.

SIGNIFICADO ECONÔMICO

Foram profundas as transformações econômicas que as cruzadas geraram. Passaram-se a cultivar novos produtos agrícolas, como o açafrão, o arroz e a cana-de-açúcar. Criaram-se novos instrumentos para a indústria e novos processos de fabricação de vidro e de tapetes. Com o estímulo ao comércio e à indústria, desenvolveram-se as cidades, onde predominava uma classe média hostil ao senhor feudal. Houve enorme expansão no comércio entre a Europa ocidental e a Ásia. Foram implantados o sistema bancário e o do crédito europeu, dando início ao capitalismo comercial. O Mediterrâneo, aberto às frotas européias, favoreceu a expansão mercantil, sobretudo de Gênova e de Veneza.

SIGNIFICADO ESPIRITUAL

Os contatos permanentes com o pensamento oriental despertaram muitas idéias heréticas na Europa ocidental. Em relação ao papado, as cruzadas provaram a incapacidade dos papas para dirigir a cristandade. É certo que elas satisfizeram o desejo de restaurar a comunhão dos cristãos do Oriente com Roma no plano espiritual, mas sua política deixou apenas uma herança amarga, que tornou o cisma irreparável.
Na realidade, as cruzadas detiveram por quatro séculos o que se julgava inevitável no século XI: a queda de Constantinopla. Muito mais que os acontecimentos do século XV, as cruzadas marcaram o início dos tempos modernos. Nelas, fase de transição, havia muito de medieval - a cavalaria, a ascendência da igreja, o feudalismo e a arte militar. Mas havia também muito de moderno - o comércio internacional, a interpenetração de culturas, a vida urbana, a pequena indústria.

A “CRUZADA DOS MENDIGOS”

Em março de 1096, 12 000 pessoas, entre elas mulheres acompanhando os maridos, crianças. velhos e camponeses desejosos de escapar à servidão feudal, levando ramos de palmeiras e cruzes, e acreditando poder derrubar os muros de Jerusalém apenas com a força da oração, partiram da França em direção à Terra Santa. Eram liderados por pregadores itinerantes como Pedro, o Eremita, e Gualtério, o Sem-Posses (Gauthier Sans-Avoir), e entre a turba só oito eram cavaleiros.
Essa multidão tinha pouquíssimas armas e quase nenhum mantimento. A marcha desordenada foi marcada por atol de pavorosa crueldade, dos quais foram vítimas muitos judeus (vistos como "inimigos de Cristo"); cidades cristãs foram saqueadas para obter alimentos; essas violências freqüentemente provocaram a reação armada dos governos das regiões por onde passavam os “cruzados”. Em julho de 1096, os viajantes alcançaram Constantinopla, onde o imperador de Bizâncio, Aleixo Comneno, aconselhou-os a não atravessarem o Estreito de Bósforo e a esperarem a expedição oficial, que só sairia da Europa em agosto. Foi inútil. A multidão prosseguiu até Nicéia, cidadela muçulmana, decidida a atacar. No entanto, foi suficiente a ação dos arqueiros turcos para fazer tombar a maior parte daqueles infelizes sonhadores.

1212 A “CRUZADA DAS CRIANÇAS”

O escândalo da Quarta Cruzada levou à crença de que só inocentes e devotas crianças poderiam libertar o Santo Sepulcro. Pregadores fanáticos convenceram os pais de 30 000 crianças a deixá-las partir desarmadas e sem suprimentos. Em Gênova encontraram capitães que as transportaram para o Egito e a Tunísia, em vez de para a Palestina; muitas foram vendidas como escravas; outras morreram e fome e doenças.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Resumão de Feudalismo

O FEUDALISMO - Adaptado de postagem do site: http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/

A “HOMENAGEM”

Trata-se de uma cerimônia com muitos gestos e símbolos, como descreve o historiador Marc Bloch (1886-1944': “Eis dois homens frente a frente: um, que quer servir; o outro. que aceita. ou deseja ser chefe. O primeiro une na mãos e, assim juntas, coloca-as nas mãos do segundo: claro símbolo de submissão (...). Ao mesmo tempo, o personagem que oferece as mãos pronuncia algumas palavras, muito breves, pelas quais se reconhece ‘o homem’ de quem está na sua freme. Depois, chefe e subordinado beijam-se na boca: símbolo de acordo e amizade”.
A “homenagem" é assim o ato pelo qual um indivíduo passa a ser admitido como “o homem”. Esse indivíduo, porém, apesar de suas palavras, não é nenhum pobre miserável: é o comes, palavra latina que significa “companheiro”; é o companheiro de batalhas de um chefe guerreiro que se tornou rei. É, portanto, um influente do reino.
Mas o seu pecar não é nada diante do rei, cuja autoridade passou a ser considerada como um desígnio de Deus. Pela vontade divina, o rei é o senhor todo-poderoso, o único proprietário legitimo de todo o reino. Ninguém é nada sem o seu consentimento e proteção.
É por isso que o comes deve reconhecer-se como um indivíduo que nada possui, e que precisa, conseqüentemente, da proteção do rei. Em troca, ele deve servir ao rei, ser-lhe fiel. Só então pode se tornar "o homem”, mas na qualidade de "homem do rei", que irá permanecer à sua disposição até a morte. Geralmente, o "homem do rei" era também denominado vassalo – palavra de origem celta que significava, no inicio, "escravo doméstico". Com o tempo porém, ser vassalo tornou-se um símbolo de honra, prestigio, poder e riqueza.
De fato, o vassalo, em troca da fidelidade e de serviços, recebia do rei uma série de vantagens (os '‘benefícios’'), principalmente o direito de posse e de administração de uma parte do reino. Tal porção de território denominava-se feudo, palavra derivada do termo românico fief (ou feu, em provençal), que por sua vez veio do germânico Vieh.
O vassalo tornava-se assim feudatário e, na homenagem, recebia alguns objetos chamados "investiduras”: desde um bastonete representando os benefícios, até uma porção de terra simbolizando o feudo, um ramo de planta verde para tornar a terra fecunda e produtiva,, uma bandeira como sinal de união entre o rei e o vassalo, e uma espada como símbolo do poder do feudatário sobre o feudo, mas também do dever do vassalo de auxiliar o rei com suas armas.

A RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA

O juramento do vassalo, que citamos na abertura, é um dos mais antigos que se conhece. Do século X ao XII – período em que o sistema de vassalagem atingiu uma forma mais acabada –, a formula do juramento bem como os direitos e os deveres do rei e do vassalo ficariam mais complexas. Apesar disso, o essencial do sistema permaneceu imutável, tendo como base dois pontos:
1) A existência de um “poderoso", que necessita de homens fiéis que o auxiliem na administração das terras e das riquezas do reino, e que organizem o exército nos tempos de guerra.
2) A existência, por outro lado, de pessoas dotadas de menos poder, e que, por isso, requerem proteção e auxilio de alguém mais poderoso. Em troca da fidelidade e de serviços, esses “homens do rei” recebem benefícios (como o feudo) e privilégios, como as “imunidades” (isenção de impostos), e os direitos de cobrar taxas de seus subordinados, de criar leis para o seu feudo, de recrutar soldados etc.
Em suma, a organização social que caracterizava o feudalismo baseava-se em relações pessoais de dependência e de ajuda recíprocas, como método de controlar e governar vastos territórios.
Mas por que surgiu na Europa um tal modo de organização da sociedade, exatamente pouco depois da fundação, no final do século VIII, do império Carolíngio, por Carlos Magno? Por que esse rei e seus sucessores, que detinham em suas mãos o domínio de grande parte da Europa, não reservaram para si todo o governo do reino?
Na realidade, esse grande território era praticamente ingovernável: as guerras eram constantes e, além disso,a Europa passava por contínuas invasões de povos guerreiros (os vikings, ao norte, os húngaros, a leste, e os árabes, ao sul).Nessas condições, Carlos Magno, do mesmo modo que os seus antecessores merovingios, só podia governar confiando parte da administração a condes, marqueses e duques, readaptando formas de dependência pessoal que já faziam parte da tradição dos povos bárbaros (como os francos e os germanos) ou das instituições romanas.
O feudalismo foi, assim, se consolidando aos poucos, não como resultado de um plano político, mas a partir de respostas imediatas a problemas e dificuldades de cada momento. Em conseqüência, o poder e a autoridade do rei foram se enfraquecendo em proveito dos feudatários, provocando na prática a divisão do reino em vários territórios autônomos e independentes entre si.

A COMPLEXA REDE DE RELAÇÕES DE DEPENDÊNCIA

Carlos Magno, coroado imperador em 800, morreu em 814. O último imperador da dinastia carolíngia foi Carlos, o Gordo, deposto em 887. Durante esse período, o feudalismo foi adquirindo a sua forma, e uma grande parte da Europa passou a se constituir de incontáveis feudos, dos quais os maiores dariam origem aos Estados nacionais modernos.

O “REINO” DENTRO DO REINO

O feudo era composto pelo território que o vassalo obtinha do soberano. O feudatário administrava, mas não era proprietário. Em outras palavras, ele apenas detinha o usufruto do feudo: o seu direito restringia-se ao uso dos frutos daquele território, isto é, os produtos da terra e os bens oriundos de impostos e de serviços de seus subordinados. O proprietário continuava sendo o longínquo soberano, que retomava o feudo quando da morte do feudatário.
Na prática, porém, o filho do falecido feudatário renovava o juramento de fidelidade ao rei e prosseguia a administração do pai. Em outras palavras, o feudo era praticamente hereditário. Na verdade, o rei, nessas condições, quase não tinha controle sobre os feudos. Desde que o feudatário não rompesse a fidelidade ao rei, poderia governar o feudo como se este fosse seu "reino" e ele mesmo, um "rei”.
Sendo uma espécie de rei no seu feudo, o feudatário podia selar acordos de fidelidade e auxílio recíprocos com outras pessoas menos poderosas do que ele. O feudatário, de fato, também precisava de auxílio para administrar o seu feudo, e isto o levava a recrutar seus “homens” por meio de uma cerimônia de homenagem com características idênticas àquela à qual ele havia se submetido. Nesse caso, o feudatário, que era um vassalo do rei, tornava-se, por sua vez, senhor de outros vassalos.
Esses “vassalos do vassalo” (vavasseurs, na região da Normandia), recebiam, em troca da sua fidelidade, parte do feudo do seu senhor a título de benefícios: um castelo, uma fortaleza vizinha a uma vila de agricultores, campos cultivados, ou até mesmo uma simples ponte ou estrada sobre as quais podiam cobrar taxas e tributos.
A complexa hierarquia do sistema de vassalagem, no entanto, não se esgotava nesse ponto: os "vassalos do vassalo” podiam também ter seus vassalos, a quem exigiam fidelidade em troca de benefícios e imunidades. Assim cada nobre era senhor ou vassalo de outro.
A sociedade feudal estava assim rigidamente organizada por uma extensa e intrincada rede de relações pessoais de dependência, baseadas em compromissos mútuos, onde cada indivíduo ocupava uma posição fixa. Cada um estava na dependência do seu senhor – até mesmo o rei: este era considerado vassalo de Deus, de quem teria recebido o reino e a autoridade em troca da fé.

AS CAMADAS DOMINADAS

Grandes feudatários, vassalos do vassalo ou modestos vassalos destes, compunham a camada dominante na sociedade feudal e pertenciam invariavelmente ou à nobreza ou ao clero. Os nobres eram poderosos porque sabiam manejar a espada e a lança; os membros do clero, porque detinham os segredos da palavra divina. Uns mais, outros menos, todos eles possuíam alguma parcela do poder e da autoridade.
Abaixo deles havia as camadas dominadas, formadas por pessoas pobres e sem nenhum poder, e que também viviam na estreita dependência do seu senhor.
Mas mesmo entre os membros dessas camadas baixas, havia uma certa hierarquia. Os homens livres eram os mais privilegiados. Os artesãos, por exemplo, que produziam artigos de ferro, couro, madeira, lã etc., eram protegidos pelos senhores, que lhes davam casa e oficina. Em troca, os artesãos deviam fornecer anualmente ao senhor uma determinada quantidade de seus produtos. Livres eram ainda os colonos, isto é, os agricultores que cultivavam as terras a eles destinadas pelo senhor, em troca da proteção. A obediência ao senhor traduzia-se também em uma série de obrigações: deviam entregar parte da produção da terra ao senhor; pagavam taxas que recaíam, por exemplo, sobre o uso do forno, da ponte etc.; e deviam executar alguns trabalhos gratuitos (consertos de estradas, construção de muralhas etc.), denominados corvéias. Em caso de guerra, além de serem obrigados a assistir seu senhor, os vassalos deveriam resgatá-la se ele caísse prisioneiro em luta. Na realidade, numa sociedade inteiramente marcada por obrigações mútuas, era muito difícil determinar quem era livre, mesmo porque as palavras que designavam as categorias sociais variavam muito conforme a época e o lugar. Além disso, os colonos, com o passar do tempo, acabaram se confundindo com os membros da camada mais baixa da sociedade feudal: os servos.

OS SERVOS DE GLEBA

As obrigações que ligavam o servo ao senhor não eram muito diferentes das do colono: parte da sua produção agrícola era destinada ao senhor; devia pagar taxas para a utilização de fornos, moinhos e tonéis; realizava trabalhos gratuitos (as corvéias); pagava impostos por pessoa; e ainda devia cultivar as terras que o senhor reservava para si.
Se não era escravo, (a palavra “servo” na origem significava “escravo”), era tido como “coisa do senhor”, o qual dispunha do seu corpo, do seu trabalho e de seus bens. Suas obrigações não provinham de um juramento, mas da sua condição: servo era servo de pai para filho. Em suma, os servos estavam presos à gleba (a terra) e ao seu senhor, a quem alimentavam com o suor do seu trabalho. Eram, portanto, os verdadeiros sustentáculos do feudalismo.

“Gregório, bispo, servo dos servos, para todos os arcebispos, bispos, duques e condes do Reino Teutônico. O rei Henrique, em súplicas constantes, se oferece para satisfazer em tudo a Deus e a São Pedro, prometendo-nos observar completa obediência para, assim, merecer a bênção apostólica. Por muito tempo discutimos o caso, e repreendemos o rei por intermédio de cada núncio que nos vinha solicitar o seu perdão. Finalmente, por sua vontade, ele [Henrique] acampou diante do nosso castelo, permaneceu três dias diante da porta de entrada, despojado de todo ornamento real, vestido miseravelmente. Estava descalço e coberto apenas por uma humilde veste de lã. Não se cansou de implorar a misericórdia apostólica, de tal forma que todos os habitantes do castelo se comoveram com suas preces. Por fim o acolhemos na graça da Comunhão e no seio da Santa Igreja.’’ Assim descreveu o papa Gregório VII o encontro com o imperador Henrique IV, que, excomungado por ele, fora a Canossa suplicar-lhe perdão. Esse episódio revela o enorme poder da Igreja na Idade Média.

A Igreja e o Império

Envolvendo o imperador Henrique IV e o papa Gregório VII, o incidente de Canossa ocorreu em janeiro de 1077 e foi o ápice de uma longa luta entre a Igreja e o Sacro Império Romano-Germânico.
No Concílio de Narbona (990), os bispos haviam decidido que a Igreja tinha o direito de impor sua disciplina a todos os cristãos, fossem estes clérigos (sacerdotes, frades, monges etc.) ou leigos (pessoas comuns, entre as quais se incluíam reis e senhores feudais).
Mas no século X a confusão na Europa era muito grande para que se pudesse compreender de imediato o significado revolucionário desse princípio: habituada a governar despoticamente, a nobreza feudal vivia num permanente estado de guerra, cujas maiores vítimas eram os servos da gleba. Diante disso, a Igreja – interessada em expandir seu próprio poder – assumiu a defesa dos servos e passou a exigir que os nobres cessassem o estado de guerra.
Primeiramente proibiu-se combater aos domingos, dia do Senhor. Depois, em 1038, o Concílio de Bourges estabeleceu que todo cristão a partir dos 15 anos era obrigado a aceitar a "Paz de Deus” e a ingressar numa milícia organizada pelos bispos e encarregada de impedir que se violasse essa paz.
Por volta de 1040, os bispos da província de Arles proclamaram a "Trégua de Deus”, pela qual a Igreja proibia que se combatesse de quarta-feira à noite a segunda-feira de manhã e em todos os dias santos. Na prática, sobravam apenas noventa dias do ano para guerrear. Essa tomada de posição contra os senhores feudais foi uma forma de reduzir a violência que se observava na Europa desde o esfacelamento do Império Carolíngio (século IX).

A CRISE NA IGREJA

Nem sempre, porém, as ordens dos bispos foram obedecidas, pois a Igreja estava saindo de um dos períodos mais negros e nebulosos da sua história.
Até o século VI, a Igreja gozara de enorme prestígio e grande poder espiritual. O papa era considerado, de fato, o sucessor do apóstolo Pedro e o representante de Jesus Cristo na Terra, ou seja, podia "abrir ou fechar as portas do Paraíso” a quem quisesse. Num mundo profundamente crente, como era a Europa nos primeiros séculos da Idade Média, isso tinha um enorme peso.
Ao longo do tempo, contudo, a Igreja acabou se tornando um verdadeiro Estado, senhora de grandes domínios territoriais. O processo iniciou-se no Império Germânico com Oto I, o Grande (século X), que decidiu apoiar-se nos clérigos para enfraquecer os poderosos senhores feudais. Assim, ao lado dos príncipes leigos, surgiram os príncipes-bispos, os bispos-condes, e assim por diante. Os dois poderes, espiritual e temporal – Igreja e Estado –, estavam indissoluvelmente unidos, mas o segundo dominava o primeiro. Coroado imperador do Sacro Império Romano-Germânico, Oto I estabelecera, em 962, com o seu Privilegium Otonianum, uma espécie de acordo pelo qual ele e seus sucessores se atribuíam o direito de eleger o sumo pontífice (o Papa).

O movimento reformador

Por essa época, os dois maiores problemas da Igreja diziam respeito ao nicolaismo (desregramento moral) e à simonia (comércio de privilégios sagrados). Além disso, quando um soberano investia um vassalo de um feudo eclesiástico (uma abadia ou igreja, por exemplo), confiava-lhe também a investidura religiosa, ou seja, tornava-o bispo ou abade. Ora, anteriormente, apenas o papa dispunha dessa prerrogativa.
Nessas condições as grandes famílias adquiriam bispados e abadias para seus filhos, que quase nunca estavam interessados nas atividades piedosas; ao contrário, os jovens clérigos-aristocratas viviam no luxo, guerreavam, tinham mulheres e dissipavam os bens da Igreja. Evidentemente, nem todos os religiosos concordavam com esse estado de coisas. Surgiram, assim, em vários pontos da Europa, movimentos que lutavam pela revitalização da vida eclesiástica, procurando combater as desmoralizantes práticas da aristocracia. O mais importante desses movimentos nasceu no início do século X, no mosteiro beneditino de Cluny, na França. Os monges pregavam o fortalecimento da disciplina, a obediência às regras da piedade e da castidade e a libertação dos conventos da dominação feudal.

A luta pelas investiduras

No século XI. a renovação monástica e o afrouxamento da tutela do poder temporal sobre a Igreja propiciaram ao papado um maior domínio espiritual, capaz de fazê-lo enfrentar a ordem política dos soberanos. Reanimada, a Igreja afirmava o próprio direito de impor a sua disciplina a todos os fiéis (inclusive o imperador); em contrapartida, o império pretendia continuar controlando a vida religiosa por meio da nomeação do pontífice e da investidura dos bispos. Na segunda metade do século XI o antagonismo estava declarado, desenrolando-se entre reis e papas a série de disputas que passou para a História como a “querela das investiduras”.
Com a morte de Henrique III, o Negro, em 1056, subiu ao trono do Império Germânico seu filho Henrique IV. Neste mesmo contexto, nobres do Império passaram a reivindicar maior independência em relação ao poder. Para piorar, em 1059, a Igreja desfechou seu primeiro grande ataque por intermédio de um decreto do papa Nicolau II. Vedando a intervenção do imperador, esse decreto determinava que a eleição do sumo pontífice devia ser de exclusiva competência dos cardeais (os mais autorizados entre os bispos). Além disso, os cristãos ficavam proibidos de receber cargos eclesiásticos das mãos de um leigo. Dessa forma, o imperador perdia o direito de investir quem quer que fosse em funções religiosas.
A tensão entre império e Igreja intensificou-se ainda mais quando Alexandre II foi eleito papa em 1061, com base nas novas normas e, portanto, sem o reconhecimento dos germânicos fiéis ao imperador. Consolidando sua posição como pontífice, Alexandre II estendeu a reforma de Cluny até a Germânia. Logo, numerosos mosteiros germânicos passaram a recusar qualquer intromissão dos grandes senhores, do imperador e mesmo dos bispos nomeados pelo rei.
Assumindo o governo da Igreja em 1073, Gregório VII condenou vigorosamente as investiduras de ofícios e benefícios eclesiásticos promovidos por leigos e, especialmente, pelo imperador. Em sua ofensiva, o novo papa chegou a proclamar a destituição de todos os clérigos investidos nessas condições.
Convencido de que competia ao papa a direção do mundo religioso, a ele cabendo a exclusividade de nomear bispos e abades, Gregório queria para o papado a ascendência sobre toda a cristandade e, portanto, também sobre o imperador. A Igreja tornava-se, assim. uma espécie de superpoder, colocado acima dos soberanos que reinavam na Europa.
Para Henrique IV (rei do Império germânico), abandonar a prerrogativa de nomeação dos dignitários eclesiásticos significava renunciar a um poder fundamental, no momento em que a maioria dos grandes senhores germânicos opunha-se ao fortalecimento do governo central. Decidido a não abrir mão do que julgava um direito adquirido, o imperador preferiu ignorar as medidas adotadas por Gregório.
Em 1075, o papa solicitou ao imperador que reintegrasse os bispos da Saxônia, destituídos de seus cargos por terem participado de uma longa rebelião (1070-75) contra o poder monárquico. Sentindo-se ameaçado, Henrique contra-atacou, nomeando um prelado hostil a Gregório para o bispado de Milão. Como era natural, o papa recusou-se a confirmar essa investidura. Em 1076, o imperador convocou os bispos alemães para um sínodo em Worms, induzindo-os a rejeitar a autoridade de Gregório VII como papa.

Uma rendição vantajosa

Em violenta reação, Gregório excomungou Henrique IV, e marchou para a Saxônia, onde esperava encontrar-se com os líderes da nobreza revoltada contra o imperador. Ao chegar a Canossa, contudo, deteve-se no castelo da condessa Matilde da Toscana, esposa de seu aliado Godofredo de Lorena.
Enquanto isso, tendo perdido o apoio dos bispos e sentindo-se ameaçado pela rebelião da Saxônia, Henrique decidiu submeter-se às imposições de Gregório. Em janeiro de l 077, no célebre encontro de Canossa, o imperador implorou durante três dias, com os pés nus sobre a neve, o perdão do papa. Concedido, finalmente, esse perdão acabaria resultando vantajoso para Henrique IV.
Na Alemanha, porém, a situação era crítica: levando a revolta às suas últimas conseqüências, a nobreza rebelde escolheu Rodolfo, duque da Suábia, para o cargo de imperador. Em 1080, Henrique marchou contra seus inimigos, enfrentando-os na batalha da Turíngia. Extremamente sangrenta, essa batalha provocou severas perdas em ambos os exércitos; mas a notícia que chegou a Roma dava a vitória às forças de Rodolfo. Acreditando-a verdadeira. o papa excomungou novamente Henrique IV.
Foi o quanto bastou para o imperador reunir o episcopado germânico e lombardo e decretar a deposição de Gregório VII. Para substituí-lo, foi eleito Gilberto, arcebispo de Ravena, que adotou o nome de Clemente III. A sorte passou então a sorrir para Henrique IV, que, derrotando sucessivamente as tropas de Rodolfo e da condessa Matilde, marchou para a Itália. Em março de 108 l, Henrique atravessou os Alpes. Em maio, chegava às portas de Roma. Pouco tempo antes, procurando reafirmar sua autoridade, Gregório declarara que "somente o papa pode ostentar insígnias imperiais (...). É-lhe permitido depor os imperadores (...). Sua sentença não pode ser reformada por ninguém (...). A Igreja Romana jamais errou e, conforme o testemunho da Escritura, jamais errará".
Mas era tarde demais. No começo de 1084, Henrique era senhor de Roma, enquanto Clemente assumia o papado no Palácio de Latrão. Refugiado no Castelo de Santo Angelo, Gregório VII aguardou a chegada de seu aliado, o normando Roberto Guiscardo, cujas forças derrotaram as de Henrique em maio do ano de 1084.

A guerra chega ao fim

Afastado o perigo, Gregório VII voltou a Roma, morrendo em 1084. Seus sucessores continuaram a “guerra” contra Henrique IV e a luta pelas investiduras prolongou-se até 1122. Nesse ano, o imperador Henrique V e o papa Calixto II firmaram a Concordata de Worms, pela qual o primeiro investiria seus feudatários como senhores, enquanto o segundo os investiria como bispos.

Durante o reinado de Carlos Magno, os árabes diziam que, no Mediterrâneo, os críticos seriam incapazes fazer flutuar uma tábua que fosse. No século XI, contudo, diversas cidades européias passaram a lançar ao mar navios que praticavam um comércio em escala cada vez maior. E esse era apenas um dos sinais das modificações sociais e políticas pelas quais a Europa passava.

A Europa depois do ano 1000

Nos séculos XVIII e XIX, diversos autores usaram a expressão Idade das Trevas para designar uma parte da Idade Média européia. Uns referiam-se ao período compreendido entre 476 e 800, em que não houve imperador no Ocidente; outros fixavam os limites entre os anos 500 e 1000, aproximadamente, que delimitaram uma época caracterizada por guerras freqüentes e pelo virtual desaparecimento da vida urbana.

NEM TANTO CONTRASTE

Os historiadores modernos, mais preocupados com a objetividade, rejeitam o conceito de Idade das Trevas, já que esse período encerra importantes formas de ordenamento político.
Em 800, Carlos Magno, o rei dos francos, recebeu do papa o título de imperador (do futuro Sacro Império Romano-Germânico); mesmo assim, a Europa estava fragmentada em numerosos reinos pequenos, e a maioria da população, constituída de camponeses, vivia uma economia de simples subsistência. Nominalmente, o imperador era o soberano, e os reis e príncipes, seus vassalos, dentro de ampla rede de obrigações. O poder político, porém, estava atomizado, fragmentado, e o único fator de integração era a Igreja.

UM NOVO CENTRO

A partir do ano 1000, foi-se firmando um novo centro econômico e político na Europa, mais ao norte que o antigo, concentrado na península Itálica. Desde fins do século IX, povos escandinavos haviam-se fixado na região que viria a ser o ducado francês da Normandia. Com o tempo, os normandos adotaram a religião cristã e a língua francesa. Em meados do século XI, a Normandia era o Estado com maior grau de centralização da Europa. Os normandos conquistaram o sul da Itália, a Inglaterra, o País de Gales, a Escócia e a Irlanda. Os duques normandos sistematizaram o feudalismo, empregando-o em benefício de um governo mais centralizado; fizeram aliança com o papado e aumentaram seu poderio ao ganhar controle sobre a administração da Igreja, ligando-se aos mosteiros, que exerciam grande influência sobre uma larga porção da Europa ocidental (no feudalismo, bispos e abades eram simultaneamente autoridades espirituais e temporais; o clero chegou a possuir um terço das terras européias).
Os normandos desenvolveram as técnicas da cavalaria e a construção de castelos; na base disso, porém, estava uma nova agricultura.

A conquista de novas terras

Já desde 850 vinha se processando o desbravamento sistemático de terras virgens na Europa, e, entre os anos 1000 e 1250, desenvolveu-se um cultivo agrícola intenso na planície entre o rio Loire, na França atual, e o Elba, no território da Tchecoslováquia e das duas Alemanhas.
No tempo do predomínio romano, essa região tinha sido uma área florestal pouco populosa. Existem registros da gradual criação ali de técnicas agrícolas melhoradas e adequadas a climas setentrionais, como o uso da charrua – arado com rodas pesadas –, da coalheira ao redor do pescoço dos animais para fixar tirantes, de enxadas e outro.implementos de ferro, em vez de madeira, da substituição do pilão pelo moinho acionado a roda-d’água. A reintrodução do sistema romano de rotação de culturas, sobretudo, contribuiu para a obtenção de melhores colheitas.

Sobe a produção, aumenta a população

A modificação das técnicas agrícolas operou uma renovação econômica e social de boa parte da Europa. A produção abundante era obtida com menos trabalho, e o senhor feudal não necessitava mais de um número tão grande de servos sujeitos à corvéia (obrigatoriedade de prestação de trabalho). Grande número de pessoas pôde ser dispensado de determinados serviços, ficando, porém, obrigadas a pagar ao senhor em produtos agrícolas ou mesmo em moeda.
Quando os filhos dos camponeses não podiam empregar-se nos campos de exploração paterna, partiam para tentar a sorte em outro lugar. Freqüentemente, o próprio senhor oferecia aos moços lotes de terras virgens para cultivar e, para atraí-los, dava-lhes instrumentos agrícolas, animais de tração e os meios necessários à sua instalação.
Com o crescimento da produção de alimentos, a fome, que pesava havia séculos sobre o mundo rural, diminuiu, fazendo baixar também o índice de mortalidade. É seguro dizer que, após o ano 1000, a população da Europa ocidental começou a crescer de modo regular. No século XII o desbravamento e a colonização de novas terras atingiram seu ápice.

O RENASCIMENTO DAS CIDADES

A melhora de rendimento do trabalho agrícola e o pagamento da corvéia em moeda ou alimentos resultaram em uma concentração de recursos nas mãos das classes abastadas. Rapidamente, os senhores feudais foram tentados ao consumo de outros bens, além dos gêneros de primeira necessidade.
Ao mesmo tempo, um número crescente de camponeses que podiam desligar-se da terra dedicava-se ao comércio ou ao artesanato, satisfazendo a demanda de novos artigos criada pelas classes superiores. Não produzindo alimentos, esses comerciantes e artesãos,por sua vez, precisavam comprá-los. No início trocava-se mercadoria por mercadoria, mas, aos poucos, o dinheiro assumiu uma importância cada vez maior, até se tornar indispensável nas transações.

As peregrinações

Apesar do estado precário dos caminhos, que só permitiam um deslocamento moroso, após o ano 1000 as populações européias começaram a viajar. Religiosos, homens e mulheres, empreendiam longas viagens para as quais o pretexto era quase sempre a visita a certos locais sagrados (Santiago de Compostela, na Galiza, Roma, Jerusalém).
Esses peregrinos não levavam provisões para a viagem inteira, mas dinheiro para pagar refeições e hospedagem ao longo do caminho. Com o tempo, aumentou o número de padeiros, açougueiros, estalajadeiros e camponeses que se estabeleciam no itinerário desses viajantes.
O incremento do tráfego de pessoas pelas estradas acarretou a circulação de mercadorias. Os camponeses vendiam aos viajantes o excedente de suas colheitas e essa foi uma das formas pelas quais o dinheiro penetrou no meio rural. Naturalmente o maior beneficiado era o feudatário, que exigia do pequeno agricultor pagamento das suas obrigações em moeda. O clero, sobretudo a partir do final do século XI, aproveitou-se dos lucros para construir novas igrejas e embelezar os santuários; a aristocracia elevou suas exigências de consumo.

O luxo penetra nos castelos

Os nobres acostumaram-se rapidamente ao luxo: à mesa, servindo iguarias raras; no vestuário, abandonando os tecidos rústicos em favor das sedas e peles; na decoração dos castelos, adquirindo objetos de adorno. Os artigos de luxo, na maioria, eram importados do Oriente, para onde o Ocidente exportava gêneros alimentícios. Paralelamente a esse comércio, cresciam a produção e a troca de alguns produtos dentro da própria Europa. Vinhos franceses eram importados pela Inglaterra e pela região flamenga (que correspondia a uma parte das atuais Holanda e Bélgica); tecidos franceses e flamengos eram exportados para outros lugares da Europa. Com a circulação do dinheiro, o comércio desenvolvia-se rápida e vigorosamente.
Na segunda metade do século XI, o tráfego de pessoas e mercadorias era tão intenso nas estradas da Europa que os castelões criaram impostos sobre as mercadorias transportadas pelos caminhos que atravessavam seus feudos.

Novos protagonistas: os mercadores

A partir do século XI, uma nova classe econômica impôs-se na sociedade medieval: a dos mercadores. Eles buscavam produtos nos locais onde eram oferecidos em boa quantidade e a preço favorável, transportando-os, depois, por via marítima, fluvial ou terrestre, até os mercados de consumo. Como sua atividade era altamente arriscada (podiam ser assaltados ou submetidos à arbitrariedade dos senhores feudais por cujas terras passavam), os mercadores geralmente uniam-se e deslocavam-se em caravanas.
Às vezes, alguns comerciantes associavam seu capital reunindo-se numa sociedade. De início, o grupo juntava-se para uma única viagem; depois, tornava-se estável. As sociedades permanentes, chamadas no norte da Europa de guildas e hansas, podiam congregar os grandes mercadores de uma determinada região, ou os transportadores e usuários de um mesmo rio, ou ainda os freqüentadores de um mesmo centro comercial. Tais associações realizavam viagens em datas prefixadas, seguiam um trajeto conhecido e encontravam-se com outros comerciantes autônomos ou pertencentes a outras sociedades nos entroncamentos dos principais itinerários, onde se efetuavam transações comerciais. Assim nasceram as feiras. Em troca de uma taxa paga ao senhor do território, este assegurava aos mercadores a proteção, a paz e a segurança necessárias à realização dos negócios.
Além da feira, surgiu outro ponto de encontro: as cidades, onde os mercadores criaram entrepostos para passar os meses de mau tempo à espera da estação das caravanas e das feiras. Assim, o incremento das atividades mercantis fez com que ressurgisse a vida urbana.

Nascem os burgos

Originariamente o castelo era apenas a habitação do senhor feudal, sua família e agregados. No decorrer do tempo, porém, tornou-se burgo, ou seja, passou a centralizar todas as atividades coletivas essenciais. Ali se encontravam os moinhos de trigo, os fornos para assar pão, as granjas, os armazéns, uma capela e até mesmo uma guarnição encarregada da defesa da comunidade.
A cidade medieval cresceu a partir dos burgos, nas vizinhanças de abadias e mosteiros, sedes de romarias periódicas, que atraíam um grande número de viajantes, ou sobre as ruínas de antigas cidades romanas fundadas no passado em virtude da posição estratégica e/ou da facilidade de comunicação. Qualquer que fosse o ponto de partida, a cidade desenvolvia-se sempre em locais bem definidos e com intenso trânsito de pessoas.
De modo geral, o novo núcleo urbano organizava-se em torno de uma praça, onde, a cada semana, se faziam as transações comerciais. As ruas que conduziam a esse espaço amplo eram estreitas e tortuosas. As casas quase sempre tinham uma loja no pavimento térreo, na qual os artesãos, egressos do meio rural, produziam e vendiam seus produtos.
A população das cidades tinha origens diversas: uma parte, por exemplo, constituía-se de mercadores que ali resolveram instalar seus negócios; a maioria, porém, era oriunda do núcleo primitivo – o castelo e seus arredores –, antigos camponeses que abandonaram a agricultura atraídos pelas vantagens do comércio ou artesanato. Qualquer que fosse a sua procedência, todos se confundiam na mesma classe social – a burguesia –, que passou a adquirir forma incipiente a partir de meados do século XI.

domingo, 1 de novembro de 2009

Muçulmanos dominaram península Ibérica - Da Página 3 Pedagogia & Comunicação - http://educacao.uol.com.br/historia/ult1690u10.jhtm

Na entrevista que segue, com o escritor e historiador Mustafa Yazbek, estudioso dos povos árabes, você vai conhecer a origem e a história do islamismo durante a Idade Média, bem como a herança e as marcas que essa civilização deixou no Ocidente, em especial na península Ibérica.

Em relação a outras religiões o islamismo é uma religião recente? Quando ele surgiu?

Ele surgiu no século 7 da era cristã. Trata-se de uma religião nova, pelo menos em comparação com outras, como o cristianismo, o judaísmo ou o budismo. Tudo começou com as pregações de Maomé, que nasceu no ano de 570, perto da cidade de Meca, na Arábia.

Quem era ou quem foi Maomé?

Era um homem pertencente a uma família tradicional da cidade, mas cuja situação era economicamente instável. Desde pequeno, Maomé acostumou-se a percorrer várias regiões do Oriente Médio, viajando em caravanas. Conheceu a Síria, a Pérsia, a Palestina, sempre mantendo contato com povos seguidores do cristianismo e do judaísmo, aprendendo tudo o que podia a respeito dessas religiões monoteístas. Com 24 anos de idade, conheceu uma viúva, uma comerciante rica chamada Khadidja, com quem se casou. Poucos anos após essa união, Maomé começou a apresentar sérias mudanças de comportamento. Sofria crises de tremores, dores de cabeça, entrava freqüentemente em transe.

Ou seja, Maomé passou por uma experiência mística. Como foi essa experiência de acordo com a tradição islâmica?

Durante anos, Maomé viveu assim, meditando e passando por essas crises que ninguém explicava. Quando ele tinha quase 40 anos de idade, disse ter recebido a visita do arcanjo Gabriel e que este lhe havia declarado: "Sou o arcanjo Gabriel, enviado por Deus para comunicar tua escolha, por esse mesmo Deus, para anunciar ao mundo suas mensagens". A partir de então, seguidamente, Maomé dizia receber mensagens, ouvir vozes. Aos poucos, recolhia essas informações com ajuda de amigos e parentes, compondo posteriormente o Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos.

Qual o conteúdo dessas mensagens?

Basicamente, o conteúdo das mensagens dizia respeito ao anúncio de uma única religião verdadeira, voltada para um único Deus, contrária à idolatria, ao paganismo que predominava entre as principais tribos que habitavam a Arábia. Maomé foi perseguido, pois sua pregação ameaçava poderes tradicionais, e refugiou-se na cidade de Iatribe (de pois chamada de Medina). Essa fuga, conhecida como Hégira (fuga ou expatriação), aconteceu no ano de 622 e marca o início do calendário lunar islâmico.

O que essa religião representou para os árabes?

Maomé e seus seguidores conseguiram, com a nova religião, dar início à unificação das tribos árabes. Fortalecido por seguidas vi tórias políticas e militares, Maomé conquistou a cidade de Meca. Manteve o centro religioso local, o templo pagão da Caaba, como símbolo da unidade religiosa, mas antes destruiu todos os ídolos ali existentes. Depois de sua morte, ocorrida no ano de 632, o islamismo teria como líderes os chamados califas (palavra que significa "sucessor").

A partir daí a expansão do islamismo foi rápida?

Rapidamente, após a unificação das tribos árabes, o islamismo, expandiu-se em todas as direções. Em poucas décadas, ocupou uma extensão de terra somente comparável ao Império romano em seu auge. Assumiria logo o papel de agente de ligação comercial entre áreas economicamente importantes do mundo de então: na Europa, na África e na Ásia. O progresso militar atingido pelos muçulmanos permitiu-lhes isolar a Europa, bloqueando o comércio especial mente através do controle do mar Mediterrâneo. Para muitos historiadores, isso acentuou uma tendência já existente desde o século 5, voltada para a vida agrária, e que conduziria a Europa ao feudalismo.

Ninguém conseguiu conter o avanço islâmico?

Não houve força capaz de deter o avanço expansionista islâmico. O Império persa e o Império bizantino estavam enfraquecidos por um longo confronto entre si. Na Europa não havia poder algum em condições de derrotar definitivamente os seguidores de Maomé, embora a expansão tenha sido contida ali, em 732, pelos francos, na localidade de Poitiers, França.

Mesmo assim, eles conquistaram a península Ibérica...

Em menos de um século, já haviam sido dominados aqueles os impérios persa e bizantino, além da maior parte do norte da África e da península Ibérica. Somente nesta última região, os muçulmanos permaneceriam por cerca de oito séculos. Quando invadiram a península, no ano de 711, empurraram a monarquia visigoda rumo ao norte, onde se concentraria a resistência aos invasores durante os séculos seguintes. Estes somente seriam expulsos definitivamente pelos reis cristãos no século 15.

Quais as causas de uma expansão tão rápida?

A numerosa população árabe, a expectativa de alcançar bons resultados nos saques e a proposta de conversão dos infiéis ao islamismo, à verdadeira religião, estão entre as principais razões que permitiram uma expansão tão rápida.

Fale um pouco sobre a ocupação da Espanha...

Ocupando território espanhol, conhecido então corno Al Andalus, os muçulmanos controlaram as terras dos reis visigodos e da Igreja. Obrigavam os camponeses a pagar um terço da produção. Ao mesmo tempo introduziram inovadoras técnicas agrícolas, que beneficiaram os agricultores. Desenvolveram as atividades comerciais. Cunharam moedas. Exploraram minérios. Construíram estradas e aproveitaram aquelas existentes desde o do mínio romano. Edificaram cidades que foram autênticos símbolos da opulência da civilização urbana andaluza, como Sevilha, Córdoba e Toledo.

Foi um momento de auge na expansão islâmica?

Sem dúvida, o apogeu do islamismo ocidental foi vivido em território espanhol e desmoronou com a Reconquista cristã, concluída no ano de 1492. No entanto, a contribuição deixada pela civilização do Islão representa uma herança que continuou depois disso a beneficiar toda a humanidade.

Quais as marcas ali deixadas por uma ocupação tão duradoura?

A longa permanência dos conquistadores muçulmanos deixaria marcas definitivas no Ocidente, e nesse aspecto o papel da Espanha foi o de ser a principal área intermediária. A cultura muçulmana no Ocidente agiu como uma força sintetizadora, levando para as regiões conquistadas o que havia de mais importante em todos os centros da atividade humana, o que havia de mais significativo no conhecimento de chineses, indianos e gregos. Traduzindo as obras dos mais importantes autores da Antiguidade clássica, os muçulmanos transferiam para o Ocidente o conhecimento acumulado durante séculos.

Cite algumas contribuições culturais dos muçulmanos na Espanha.

Eles contribuíram para o desenvolvimento da cartografia e da astronomia, da química e da medicina, da indústria e do comércio, da arquitetura e da matemática, da filosofia e da literatura. Introduziram no Ocidente os algarismos hindus (hoje chamados arábicos). Desenvolveram a álgebra e a astronomia. Imortalizaram nomes como o do médico e filósofo Averróis, comentarista da obra de Aristóteles. Como o também do médico e filósofo Avicena, que teve sua obra enciclopédica, chamada "Cânon", utilizada durante muito tempo nas escolas européias de medicina. Como o historiador Ibn Khaldun, que muitos vêem como precursor da abordagem científica da vida social. Como o sábio Al Biruni, que se dedicou a praticamente todas as disciplinas científicas de seu tempo.

Disso tudo pode se concluir que o islamismo, naquela época, foi muito mais que uma religião?

Mais do que simplesmente uma religião, o islamismo pode ser definido como uma civilização, um movimento ao mesmo tempo político, religioso, econômico e social, que, a uma velocidade extraordinária - tanto em termos de tempo quanto de espaço -, se expandiu pelo mundo, O Islão começou com os árabes, mas não se limitaria a eles. Em pouco tempo, os árabes seriam um entre os vários povos formadores da civilização islâmica, ao lado de andaluzes, iraquianos, berberes, iranianos, turcos, sírios, além de outros.

Matéria da revista Super sobre o Alcorão e a trajetória de Maomé

O Alcorão
O mercador Muhammad ibn Abdallah dormia tranqüilo numa caverna próxima à cidade de Meca, atual Arábia Saudita. De repente, foi arrancado do sono por uma devastadora sensação da presença divina. Ele tinha 40 anos e aquela era sua primeira experiência sobrenatural. Um anjo apareceu e ordenou: “Recita!” Muhammad tentou argumentar que não era digno de pronunciar palavras divinas, mas o anjo abraçou-o com força, fazendo-o soltar todo o ar do pulmão. “Recita!”, insistiu. O mercador obedeceu. Recitou aquela vez e continuou recitando a cada vez que o anjo falava com ele. Isso durou 23 anos, até sua morte, em 632 d.C. As palavras divinas proferidas por Muhammad – ou Maomé, como o chamamos em português – foram reunidas versículo por versículo no Alcorão (em árabe, recitação), livro sagrado seguido até hoje por um quarto da população mundial – 1,3 bilhão de pessoas, incluídos aí os terroristas que participaram do atentado do dia 11 de setembro.
Pouco compreendido pelo Ocidente, o Alcorão sempre foi uma espécie de caixa-preta do Islã, envolto num clima tão misterioso quanto o corpo das mulheres afegãs sob a burqa (cujo uso obrigatório, por sinal, não está no Alcorão, que apenas recomenda a elas que se vistam “com pudor”. O livro estabelece claramente que as mulheres devem ser bem tratadas e que possuem igualdade de direitos com os homens). Os 114 capítulos do Alcorão, chamados de suras, estão ordenados de uma maneira bem diferente da organização encontrada na Bíblia, por exemplo. Para começar, não começam pelo começo, como na história da criação do Gênesis. “As suras são organizadas por temas”, diz o libanês Samir El Hayek, tradutor da primeira edição, no Brasil, do Alcorão em português. Ou melhor, tradutor do “significado do Alcorão”, já que os muçulmanos só chamam de Alcorão a versão original, em árabe, com as palavras exatas de Alá (para o Islã, não houve alteração nenhuma no texto desde que ele foi escrito).
Essa é outra diferença do Alcorão quando comparado com o Novo Testamento. O livro sagrado dos muçulmanos é a própria revelação, a manifestação de Deus (Alá, em árabe) – um papel comparável ao de Jesus no Cristianismo. Embora o texto possa soar repetitivo e enfadonho em português, em árabe as palavras ganham musicalidade. “Seu estilo entre a prosa e a poesia é inigualável”, diz Safa Jubran, professora de árabe da Universidade de São Paulo (USP). O livro não é importante apenas pelo conteúdo do que está escrito lá – as próprias palavras são sagradas, independentemente de compreendermos seu significado. Por isso, devem ser lidas em voz alta, para que envolvam o ouvinte e ele sinta a transcendência e a presença de Alá – os muçulmanos contam que várias pessoas converteram-se ao Islamismo só de ouvirem o Alcorão.
Mas há muitas semelhanças entre os livros sagrados dos judeus, dos cristãos e dos muçulmanos. O anjo que ditou as palavras para Maomé é Gabriel, o mesmo que avisou Maria da sua gravidez. Além disso, o Alcorão admite que Abraão, Moisés e Jesus receberam, de fato, mensagens divinas. Só que Jesus, para o Islã, não é o filho de Deus, mas um dos grandes profetas, assim como Moisés e o patriarca Abraão, ambos da linhagem dos judeus – daí o Islã compor, junto com o Cristianismo e o Judaísmo, o grupo das religiões abraâmicas. “Reconhecemos o Antigo e o Novo Testamento como parte da mensagem divina”, diz o xeque Ali Abdune, do Centro Islâmico de São Bernardo, em São Paulo.
Ou seja: assim como os cristãos acreditam que o Evangelho veio completar o Antigo Testamento, os muçulmanos crêem que o Alcorão é a versão definitiva da palavra divina. Depois dele, não haverá novas mensagens. Por isso, a riqueza de detalhes. Entre os seus 6 326 versículos, há desde instruções para o casamento até regras sobre como o governante deve agir na cobrança de impostos. “O Alcorão é um sistema econômico, jurídico e político”, diz o xeque Jihad Hassan Hammadeh, um dos líderes da religião islâmica no Brasil.
Para aquele povo disperso no deserto, o livro caiu como uma luva. Os árabes não tinham propriamente uma religião que os unisse e que desse sentido a suas vidas. Tinham deuses e cultuavam ídolos como a pedra preta – até hoje mantida ao lado da Caaba, o prédio sagrado em Meca na direção do qual os muçulmanos do mundo rezam. Sua lei também era muito simples. Não havia pena nem para casos de homicídio: a tribo do assassinado tinha direito de matar qualquer um da tribo do assassino. A vida valia pouco. Com regras desse naipe, logo não sobraria árabe para contar a história. A lei do Alcorão trouxe uma boa dose de ordem e sossego. Por exemplo, proíbe o assassinato entre os muçulmanos e faz deles irmãos.
Quando Deus estabelece regras sobre negócios e lei penal, fica difícil para um soberano revogá-las. Por isso, no mundo islâmico, os líderes políticos sempre tiveram que se submeter aos preceitos do Alcorão, pelo menos até o século XIX. Não é à toa que, além de profeta, Maomé foi um líder político, que ergueu um poderoso Estado. Ele resolvia conflitos, estabelecia regras e guiava seus súditos-fiéis. “No Antigo Testamento essa intersecção entre religião e Estado também existia, mas o Evangelho afrouxou-a. Jesus disse: ‘Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus’”, diz o historiador holandês Peter Demant, especialista em relações internacionais e Oriente Médio, que dá aulas na USP.
Muito sangue foi derramado ao longo da expansão do Islamismo, inclusive durante a vida de Maomé. O profeta usou a espada para se defender das tribos árabes politeístas que o acusavam de heresia por pregar a existência de um Deus único. Várias passagens do Alcorão justificam essa ação pela força. As instruções de Alá para lidar com os politeístas, por exemplo, teriam sido recebidas pelo profeta num desses momentos de guerra. Primeiro, diz o texto, deve-se tentar convertê-los. Caso eles não aceitem a proposta, podem manter sua fé, desde que paguem tributos. Se os infiéis, ainda assim, não toparem, acabou-se a diplomacia: “Matai os idólatras, onde quer que os achei; capturai-os, acossai-os e espreitai-os”. O resgate das passagens belicosas do Alcorão por líderes e governantes em tempos de guerra foi uma constante em seus 14 séculos de história.
O Alcorão, então, é um hino de guerra? Longe disso, dizem tanto adeptos da fé muçulmana quanto cientistas que escrutinam as religiões. “Pelo Alcorão, a única guerra justa é a de autodefesa”, escreve a teóloga inglesa Karen Armstrong, ex-freira católica e profunda conhecedora das três religiões abraâmicas, em seu livro Uma História de Deus. “Deus disse que quem mata um inocente mata toda a humanidade”, afirma o xeque Jihad. Além disso, a presença de mensagens violentas não é exclusividade do Islamismo. “Tanto a Bíblia quanto o Alcorão têm trechos de violência”, diz Eliane Moura da Silva, professora de história das religiões da Unicamp. “Maomé era um guerreiro e um estadista em defesa da sua fé, mas não há como negar que personagens do Antigo Testamento, como Josué, líder dos judeus na conquista da Terra Prometida, também eram.”
O entendimento do Islamismo, no entanto, vai além do Alcorão. Quando morreu, em 632, Maomé deixou a seus seguidores, além do livro sagrado, seu exemplo de vida, que, segundo Alá, deve ser imitado. Essa tradição, que, em árabe, diz-se suna, é composta pelos atos e dizeres de Maomé, chamados de hadiths. “Para os muçulmanos, os hadiths são leis, inferiores apenas ao livro sagrado e vigoram até hoje, regendo boa parte da vida cotidiana”, diz o xeque Jihad. É um hadith, por exemplo, que proíbe aos artistas a reprodução fiel de animais, baseado no preceito de que só Deus pode dar a vida. Representar seres humanos, então, nem pensar.
Apesar de inquestionáveis, os hadiths passaram por muitas transformações até chegarem à forma atual. Muitos foram transmitidos oralmente por mais de 100 anos até serem escritos e houve muitas alterações, devido à precariedade da tradição oral e à incorporação de tradições dos vários povos do mundo árabe.
Para organizar essa bagunça, criou-se, já no século VII, uma ciência para estudar os hadiths e checar sua credibilidade. Essa tarefa hercúlea e, às vezes, impossível, de compilação dos atos e palavras de Maomé incluía visitas às cidades onde viveram as testemunhas e comparação de dados, como datas e lugares, com o que dizia a lei. Desse processo emergiram, no século IX, seis grandes coleções de tradições que, juntas, contêm milhares de hadiths. Mas isso não quer dizer que a lei islâmica tenha sido engessada naquela época. “O Alcorão ganha valor à medida que é interpretado em cada comunidade, de acordo com seus interesses”, diz a historiadora Eliane, da Unicamp.
Assim, as dúvidas que sobrevivem ao exame do Alcorão e da suna devem ser submetidas a uma terceira instância: o ijma, ou o consenso da comunidade. “Maomé teria dito: ‘Na minha comunidade não tem erro’. Se há consenso, aquilo é verdade”, diz Peter Demant, da USP. Um ijma encerra a questão e se transforma em uma lei. Tratava-se de um processo democrático, de toda a comunidade. Aos poucos, porém, a opinião dos estudiosos das leis foi valorizada e os ulemás, uma espécie de clero muçulmano, ganharam status de legisladores, muitos deles trabalhando dentro do governo.
Quando Maomé morreu, surgiu um problema: a escolha do seu sucessor. Nem o Alcorão nem os hadiths versavam sobre o assunto. Não demorou muito e as disputas começaram. O terceiro sucessor do profeta (khalifa, em árabe) foi assassinado por opositores. Seu substituto, Ali ibn Abi Talib, primo de Maomé e marido de sua filha, teve que defender sua legitimidade à força e, após um período de guerras, propôs um consenso com seus opositores. Tudo isso seriam apenas intrigas de poder não fosse a sobreposição, no Islamismo, das lideranças política e religiosa. Para quem acreditava que a sucessão do profeta era ditada por Deus, a tentativa de resolver a questão pelo entendimento pareceu uma blasfêmia. A ponderação, assim, enfraqueceu Ali, que acabou assassinado. Seus partidários deram origem a uma facção islâmica para a qual Ali, como sucessor legítimo do profeta, é iluminado e infalível. São os xiitas (de shia, que significa “partido”, em árabe), um ramo minoritário no Islamismo, mas prevalente até hoje no Irã. A grande maioria dos muçulmanos, porém, cerca de 90%, só crêem na tradição do profeta, a suna. São os sunitas.
As divisões não evitaram que, num piscar de olhos, a mensagem do Alcorão se espalhasse pelo mundo. Em apenas 200 anos, a palavra de Alá e os exércitos árabes já tinham conquistado toda a península arábica, o norte da África e a Ásia Central. Em seguida, foram anexados Espanha, Portugal e grande parte da Índia. O ímpeto expansionista árabe chegou até a China. Como é que uma mensagem revelada numa caverna do deserto de repente conquistou os espíritos de meio mundo civilizado?

Bem, há várias respostas. Uma delas é a já citada semelhança entre o Islamismo e as outras duas religiões monoteístas. Para um judeu ou um cristão, a nova fé parecia familiar, embora o uso de nomes conhecidos e sagrados em situações inusitadas pudesse parecer heresia. O Alcorão diz, por exemplo, que Jesus não foi crucificado, mas abduzido por Alá e elevado aos céus. Quem acabou na cruz foi Judas, transformado, como punição, em sósia de Cristo.
O Alcorão não obriga à conversão e, ao menos nos primeiros séculos da nova fé, a tolerância religiosa era a regra – muito mais do que em terras cristãs. Tanto é verdade que, nas regiões que administravam, os muçulmanos eram absoluta minoria até o século XI. Essa tolerância está expressa no texto sagrado: “Não disputeis com os adeptos do Livro senão da mais pacifíca maneira”. Os “adeptos do Livro” são os cristãos e os judeus. “Nosso Deus e o vosso são Um e a Ele nos submeteremos”, prossegue o Alcorão, deixando claro que respeita e aceita as outras duas crenças que adoram o mesmo Deus, seja chamando-o de Alá ou Jeová.
Mas havia formas sutis de incentivar o ingresso de novos fiéis. Para começar, viver em um Estado com leis regidas por uma fé alheia não era muito confortável, por mais que houvesse respeito. Além disso, os muçulmanos tinham privilégios: eram isentos de certos impostos e tinham muito mais chances de subir na vida e trabalhar no governo. Para completar, a conversão era moleza – bastava reconhecer em voz alta, perante testemunhas, e em árabe, que só existe um Deus e que seu profeta é Maomé. Pronto. Um muçulmano a mais.
Nos primeiros séculos, o império era administrado por um homem só – um califa sediado primeiro em Medina (na Arábia Saudita), depois em Damasco (na Síria) e depois em Bagdá (no Iraque). Mais tarde, o poder se fragmentou, com vários califas simultâneos. Mas não importava quantos eram os governantes, nem as diferenças entre suas decisões, seguindo uma ou outra escola de interpretação do livro sagrado. Viajantes que cruzaram o império de ponta a ponta relataram uma sensação de que o mundo muçulmano era um só. Em toda parte valiam os cinco pilares da religião: aceitar que há só um Deus e que seu profeta é Maomé; rezar cinco vezes por dia voltado para a Meca; ajudar os pobres; jejuar no mês sagrado do Ramadan; e peregrinar até a Meca uma vez na vida. Mais que isso: um livro guiava todos, o Alcorão.

Maomé havia dito que “aquele que sai de casa em busca do conhecimento está trilhando o caminho de Deus”. O profeta afirmou também que isso vale para homens e mulheres (em clara discordância com o regime de países como o Irã e o Afeganistão de hoje, que negam às mulheres o acesso ao estudo). Dentro desse espírito, nascia, no século X, a Universidade Azhar, do Cairo, a primeira do mundo, que atraía muçulmanos de toda parte. O conhecimento prosperava. Os muçulmanos formavam a vanguarda na matemática, na astronomia, na medicina e na química.
Filósofos gregos, inteiramente esquecidos pela Europa medieval, eram traduzidos para o árabe – o racionalismo de Aristóteles, em especial, gozava de muita popularidade. Inspirado por ele, o filósofo persa Avicena defendia a idéia espantosamente moderna de que a razão humana podia levar a uma verdade demonstrável e tentou analisar o Alcorão à luz da lógica. Para ele, a iluminação do profeta não era divina, mas intelectual (séculos depois, ainda queimava-se gente por muito menos no mundo cristão). Não havia cidade na Europa que se comparasse aos centros islâmicos. Só o Cairo abrigava população correspondente à das três maiores cidades cristãs, juntas: Paris, Veneza e Florença. O império islâmico vivia seu auge. O mundo era deles.
Nesse momento, os árabes sofreram uma agressão inesperada bem pertinho do seu coração. Em 1095, o papa Urbano II ordenou, de Roma, um ataque para tomar Jerusalém. Começavam as Cruzadas, que duraram 200 anos. A cristandade não tem muito do que se orgulhar desse episódio – propiciou cenas pavorosas, inclusive massacres de civis – e acabou perdendo a guerra e a Terra Santa. Mas, embora ninguém suspeitasse disso naquela época, começava ali a decadência do Islã. “O efeito psicológico foi muito forte. A luta estimulou o fechamento mental religioso”, afirma Demand.
As invasões geraram um fenômeno que jamais tinha existido antes: uma sensação de confronto entre a cristandade e o Islã. Os cristãos passaram a demonizar Maomé e sua fé. Karen Armstrong conta, em seu livro Muhammad (sem versão em português), que as ofensas ao profeta viraram regra na Europa do século XI. A propaganda antiislâmica incluía chamar Maomé de pervertido sexual, charlatão e insinuar que ele fosse o diabo em pessoa.
Na mesma época, muitos muçulmanos adquiriram um profundo ressentimento pelo Ocidente, atribuindo a ele toda a culpa pelo fim dos tempos gloriosos do Império Árabe – um sentimento que chegou até os nossos dias. Algo mudara no mundo islâmico. “Ele tornou-se friorento, defensivo, intolerante, estéril”, afirma o historiador libanês Amin Maalouf, no ótimo livro As Cruzadas Vistas pelos Árabes. O Alcorão continuou o mesmo, mas passou a ser interpretado com mais rigidez.
Já era esse o clima quando a dinastia fundada pelo sultão Osman tomou a cidade cristã de Constantinopla, antiga capital do Império Bizantino, e a rebatizou de Istambul. Nascia ali, em 1453, o Império Otomano (referência ao próprio Osman), que, em algumas décadas, tomou quase todas as terras do antigo Império Árabe. Osman era de etnia turca, um povo com fama de mau que se converteu ao Islamismo no século VIII. Os turcos entraram no mundo árabe como soldados e galgaram o comando do exército. Agora viravam sultões (em turco, “detentores do poder”. Osman não ousou tomar para si o título de califa, reservado a descendentes do profeta). A partir daí, cabia a eles zelar pelo povo que seguia o Alcorão.
No entanto, o mundo havia mudado. Militarmente, o Islã continuava sendo uma potência. Mas a vanguarda do planeta não estava mais ali. O centro estava mudando para oeste – a Europa. Lá, uma série de guerras religiosas detonou revoluções ideológicas que soltaram as rédeas do pensamento e rebocaram a sociedade para uma época de desenvolvimento: o Renascimento e o Iluminismo. Impulsionados pela filosofia e pela ciência, inclusive aquelas trazidas das terras árabes, os europeus decidiram limitar o poder religioso sobre os assuntos terrenos. O primeiro passo foi cortar alguns poderes do rei, considerado antes uma figura divina. Ato contínuo, cortaram também a cabeça de alguns monarcas. Liberalismo político e econômico logo transformaram os países do Ocidente em potências laicas.
No Islamismo, ao contrário, as luzes jamais voltaram a brilhar como antes do recrudescimento religioso decorrente das Cruzadas. Religião e política não se divorciaram. O historiador Alberto Ventura, do Instituto Universitário Oriental, de Nápoles, Itália, sugere, em um artigo, que esse pensamento de laicização do Estado e da ciência não prosperou no Oriente justamente porque a fé islâmica procurou conciliar o raciocínio. “Os textos sagrados do Islamismo nunca entraram em incurável conflito com a observação racional das coisas.” Para Ventura, os muçulmanos interpretam o Alcorão de um modo intermediário: nem o levam ao pé-da-letra nem o transformam em uma alegoria. “O esforço por harmonizar os dois lados não permitiu uma separação clara entre as esferas da religião e do conhecimento. Na cultura cristã, elas entraram em antagonismo e cristalizaram suas identidades.” Cada uma no seu terreno.
O progresso europeu engoliu o Império Otomano. Primeiro, economicamente; depois, militarmente. A partir da metade do século XIX, quase todos os países islâmicos foram dominados e ocupados pelas potências européias – a Itália ocupou a Líbia, a Inglaterra ficou com o Egito, a França levou a Argélia etc. A modernidade ocidental caiu como uma bomba sobre o Islã. A nova ordem enfraqueceu as alianças tradicionais, a educação islâmica já não garantia emprego no governo, os diplomados não controlavam mais o sistema judicial, as forças policiais sufocavam qualquer tentativa de revolta.
Pouco a pouco, a absorção dos valores ocidentais tornou-se uma condição de sobrevivência no mundo islâmico. Entre os intelectuais islâmicos, ficou clara a idéia de que o caminho do progresso era a reforma do Estado, com tudo o que isso implica: fazer eleições e criar leis que abrissem as portas do mundo moderno. Mas essas mudanças seriam um abandono das regras teocráticas do Alcorão – e sem elas não havia Estado, porque a religião é que dava identidade à população. A idéia de nação ainda era alienígena naquela parte do mundo. A maioria do povo não se sentia tunisiana, egípcia ou líbia, mas muçulmana. Sem esse elo, sobravam alguns vínculos tribais e culturais. Só.
Começaram a surgir tentativas, em vários países, de criar governos democráticos baseados nos princípios do Alcorão. Todas fracassaram, muitas vezes por causa da enorme ingerência das potências européias. “No Egito, entre 1922 e 1948, houve 17 eleições, todas vencidas pelo partido populista, mas só cinco conseguiram governar, porque a Inglaterra intervinha sempre que o resultado não era o desejado”, afirmou a teóloga Karen Armstrong, em entrevista à revista eletrônica Salon. Os governos ditos democráticos tinham regras rígidas também para regular o dia-a-dia dos cidadãos. Na Turquia, o governo fechou as escolas religiosas e proibiu as mulheres de sair com véus. “Muitas deixaram de sair de casa por vergonha”, diz Eliane. No Irã, o xá Reza Pahlevi deu ordens à sua guarda para atirar em manifestantes que protestavam contra o uso obrigatório de roupa ocidental. Muito propagandeados pelos governos da época, alguns valores ocidentais, como a democracia, ganharam uma péssima fama entre os muçulmanos.
A gota d’água no sentimento de fracasso dos muçulmanos diante do Ocidente ocorreu com a humilhante derrota para Israel, em 1967. “Depois do florescimento, a derrota causa uma sensação de que se tomou o caminho errado”, diz o egípcio Mohamed Habib, coordenador de Relações Institucionais e Internacionais da Unicamp.
Adivinha onde os muçulmanos foram procurar as respostas para essas seguidas derrotas? Lá mesmo, no Alcorão. “É aí que surgem os movimentos de resgate das raízes, dos fundamentos da religião”, diz Demant. São os fundamentalistas.
A situação era propícia a interpretações literais. Primeiro, porque não há sacerdotes no Islamismo: cada um ora diretamente a Deus, sem intermediários. A herança de séculos de interpretações harmoniosas e tolerantes do Islã é transmitida à população pelos ulemás, os estudiosos da doutrina. Só que, a partir da ocupação dos países islâmicos, no século XIX, os ulemás se distanciaram do povo. Quando os inconformados foram buscar conforto no livro sagrado, o fizeram sem orientação ou, pior, sob a tutela de outros fundamentalistas – como o Taleban, que mantém escolas para difundir sua leitura do Alcorão aos desvalidos. A interpretação peculiar desses fundamentalistas ignora os comandos explícitos de respeitar as outras “religiões do Livro” (americanos e israelenses são associados aos “idólatras” inimigos de Maomé do século VII), passam por cima da proibição de matar inocentes (com a desculpa de que todo ocidental é inimigo e, portanto, não há inocentes entre eles) e pinça no texto apenas os trechos mais sangüinolentos. Seu discurso está cheio de ressentimento – há quem chame Israel de um “Estado cruzado”, numa extemporânea referência a uma guerra terminada há sete séculos, mas que não acabou de ser digerida. Os fundamentalistas são ínfima minoria no Islã, mas, com ações de grande repercussão, acertam em cheio os corações de milhares de muçulmanos com baixa auto-estima – a causa antiocidental resgata a tão machucada identidade islâmica.
Mas há também fundamentalistas islâmicos pacifistas e eles são a maioria, segundo Karen Armstrong. “Esses grupos”, diz ela, “buscam nas palavras de Maomé o espírito de paz e justiça social” – aquele mesmo que ajudou um povo miserável e disperso do deserto a erguer um dos mais iluminados impérios da história. Está tudo no livro.

domingo, 20 de setembro de 2009

Baixo Império de 235 a 476 d.C.

Fonte: Material didático do Professor André Ribeiro Vieira e do Cursinho popular dos estudantes da USP, da ACEPUSP 2007




Antecedentes

O Alto Império romano foi caracterizado pelo Principado iniciado quando Augusto recebeu do Senado o título de Princeps, que quer dizer O Primeiro Cidadão (civil) de Roma (e do Senado). A estrutura política romana de então se apresentava como uma monarquia mitigada, pois o poder do príncipe, em Roma, era limitado, devendo, este, respeitar as instituições como nos tempos da República; por outro lado, nas províncias, a monarquia era absoluta, lá o príncipe tinha totais poderes.

Embora os Princeps já apresentassem tendências absolutistas, considera-se que, no império de Diocleciano (284-304), em 285, após a anarquia militar, o imperador deixou de ser Princeps e passou a ser reconhecido como Dominus (Senhor), caracterizando um governante absoluto. Inicia-se, então, o período do Dominato (Domínio).

Os déspotas do Dominato romano impunham sua condição de dominus superior, ostentando coroas de louros e outros adornos, obrigavam os súditos a ajoelharem-se e beijar a ponta de seus mantos reais.

Outra forte característica do Alto Império romano é o fim da expansão territorial. Roma havia alcançado sua maior extensão, e as guerras praticamente findaram. As últimas conquistas foram a Arábia, a Armênia e a Mesopotâmia, que ocorreram no império de Trajano, entre 101 e 110 d.C. O Baixo Império, então, representa a decadência resultante de políticas imperialistas que alcançaram o domínio de toda a região, sobrepondo-se a todas as outras sociedades.

O Baixo Império se inicia com as invasões bárbaras.

Sociedade

O final da expansão territorial também marcou a redução do número de escravos, gerando crise no sistema de produção e aumento das despesas, que, por sua vez, resultou déficit orçamentário, levando o governo a intervir na economia por meio de aumento dos impostos.

A população do campo começou a trabalhar para os colonos em troca de proteção, criando o sistema conhecido como Colonato.

O colono era o Senhor, o proprietário da terra. As terras de um colono eram a Villa. Com o tempo os escravos dos Senhores iam sendo libertados e, aos poucos, tornavam-se, também, colonos.

Os colonos eram:

* os bárbaros que penetravam nas fronteiras com o consentimento do governo;
* os cidadãos que deixavam as cidades;
* escravos que trocavam a escravidão pela servidão; e eram também
* os pequenos proprietários.

Os colonos também eram cidadãos de clientes que, por sua vez, eram os senhores das vilas, em uma conotação bastante diferente dos colonos nos períodos monárquico e de república.

A estrutura social do Baixo Império já apresentava as características estruturais das sociedades no período de transição da Idade Antiga para a Idade Média.

Fragmentações e crise

Nas fronteiras da Germânia, no entanto, os bárbaros eram empurrados pelos mongóis que migravam da Ásia e pelos eslavos da Rússia de hoje, para as províncias de Roma.

O antigo sistema de produção existia em função do benefício aos patrícios. Com o término da expansão territorial, a crise econômica, a qualidade de vida da população decaiu e as perspectivas de melhorias tornaram-se cada vez mais nulas.

O despovoamento do império

Uma questão que já preocupava o primeiro imperador de Roma, Augusto (27 a 14 a.C.), agravou-se no século IV, com:

* as guerras civis contra a escravidão e a divisão de riquezas característica do período;
* as lutas pela independência das províncias;
* as constantes invasões bárbaras;
* a epidemia da peste bubônica que durou 15 anos e ceifou milhões de vidas, decorrente das péssimas condições urbanas e sanitárias;
* a coexistência, no interior do império romano, de colônias de bárbaros que, depois de aprisionados, recebiam terras em troca de serem convocados, quando necessário, para o serviço militar etc.

A estagnação econômica e os impostos

A instabilidade e a desordem administrativa acarretam dificuldades econômicas na agricultura, mineração, artesanato e comércio. Os saqueadores proliferaram nas estradas mal conservadas e desprovidas de segurança. Os preços, conseqüentemente, se elevaram gerando grave inflação. Os governantes não conseguiram conter a inflação nem quando Diocleciano tabelou os "preços máximos" por decreto. O resultado disso tudo foi o empobrecimento generalizado da população romana, na capital e nas províncias, contrastando-se com o luxo em que se mantinha a corte imperial, os patrícios e os militares corrompidos.

Além disso, o serviço público e o exército representavam despesas gigantescas.

A anarquia militar (235 a 285)

Até então Roma vinha mantendo o controle das províncias por meio de suas legiões, isto é, de suas divisões militares que totalizavam 6.000 homens. Mantido com muita disciplina, o exército era o braço forte do Império. Com a crescente instabilidade da estrutura econômica, social e política, oficiais e soldados dos mais sanguinários começaram a se beneficiar com privilégios oferecidos no regime de Comodus, como tentativa de superar a crise. Esse império foi marcado pela ambição desmedida pelo poder absoluto e autoritário, que levou o imperador a iniciar o processo de corrupção na esfera militar e, conseqüentemente, o processo de decadência do Império Romano.

A tirania de Comodus foi seguida e intensificada por Septimus Severo (193-211) que, concedendo privilégios tão exagerados, provoca o Caos Militar, leva os militares a ambicionar o poder.

Após o assassinato pelos militares de Alexandre Severo (231-235), filho de Septimus Severo, seis generais militares foram sucessivamente reconhecidos como imperadores pelo Senado. Além desses, houve também aqueles que usurparam o título indevidamente. Todos esses tiranos enfrentaram graves guerras civis e morreram violentamente.

A anarquia militar termina com as reformas do imperador Diocleciano, que procuraram descentralizar o poder, revitalizando o Senado, se aproximando, ligeiramente, dos interesses da plebe.

Constantino: Constantinopla e Cristianismo

Constantino (307-337) deu continuidade às reformas de Diocleciano, mas as estruturas de Roma, no âmbito social, político e econômico, já se apresentavam fragmentadas e enfraquecidas para o enfrentamento da pressão externas que vinha do nordeste europeu, do Oriente Médio e da Ásia.

É provável que Constantino seja o mais famoso imperador do Baixo Império. Fundou, em 330 d.C., Constantinopla, antigo Bizâncio, próximo do Mar Negro, transferindo para lá a capital do Império Romano, por julgá-la estrategicamente mais propícia ao comércio e à defesa aos ataques bárbaros.

Com a publicação do Edito de Milão em 313, Constantino estabelece a tolerância religiosa e a liberdade ao culto para os cristãos. Para solucionar as rivalidades entre as seitas religiosas, o imperador convoca uma assembléia de bispos denominada Concílio de Nicéia. Tal concílio condenou como heresia a concepção religiosa de Ário, bispo de Alexandria, aceitando como ortodoxa (verdadeira, tradicional) a concepção do bispo Anastácio. Segue texto do documento expedido pelo imperador:

Eu, Constantino Augusto, assim como eu, Licínio Augusto, reunidos [...] em Milão [...], entendemos dever [...] dar aos cristãos, como a todos, a liberdade e a possibilidade de seguir a religião da sua escolha [...] afim de que a divindade suprema, a quem rendemos espontaneamente homenagem, possa testemunhar-nos em todas as coisas o seu favor e a benevolência costumados [...]. (Apostila do ACEPUSP, Cursinho popular dos estudantes da USP, 2007).

O imperador seguinte, Teodósio (378-395), outorgou o Cristianismo como religião oficial do império. Teodósio restabeleceu as divisões Império Romano do Ocidente, com Roma como capital, e Império Romano do Oriente, mantendo Constantinopla como capital, que viria a ser o Império Bizantino.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Para os fãs de documentários aí vai um Link de um documentário da BBC

http://www.youtube.com/watch?v=3Fa6iiJ1ZPQ
ResumãoRoma (fatos que serão cobrados em nossa prova bimestral e não constam no material didático)

Monarquia ou Período da Realeza (753 a.C. - 509a.C.)
Contexto marcado pela economia agropastoril e pela organização de uma federação que agrupava as diferentes tribos que habitavam as 7 colinas de Roma. O primeiro reinado foi, provavelmente, exercido por Rômulo e os reinados subsequentes respeitaram o revezamento de reis latinos e sabinos até a cidade ser conquistada pelos Etruscos.
Sob domínio da Etrúria, Roma viveu uma radical transformação econômica e urbanística: o comércio desenvolveu-se; a cidade passou a contar com aquedutos e rede de esgoto (cloaca máxima); lucérios (um povo que não era nem latino nem sabino) passaram a compor o Senado, que foi bastante ampliado.
Durante o terceiro reinado etrusco, porém, uma reação aristocrática derrubou o regime monárquico a fim de minar as ingerências da Etrúria. Em 509 a.C., A República foi proclamada e Roma teve de enfrentar, definitivamente, seus problemas internos como a luta de classes entre patrícios e plebeus.

República (509a.C. - 27a.C)
Estrutura Social
Patrícios – grandes proprietários que dominavam o Senado, dispondo de amplos privilégios e direitos.
Clientes - homens livres que se associavam aos patrícios, prestando-lhes diversos serviços pessoais em troca de auxílio econômico e proteção social;
Plebeus – trabalhadores livres; compunham as centúrias (conjunto de 100 soldados com direito a 1 voto nas eleições de cônsules e magistrados); não dispunham de representantes no poder e estavam sujeitos à escravidão por dívidas, bem como aos desmandos do patriciado.
Escravos - eram, em sua maioria, prisioneiros de guerra. Trabalhavam nas mais diversas atividades, como serviços domésticos e trabalhos agrícolas. Desempenhavam funções de capatazes, professores, artesãos etc. O escravo era considerado bem material, propriedade do senhor, que tinha o direito de castigá-lo, vendê-lo, alugar seus serviços, decidir sobre sua vida ou morte.
Estrutura Política
Consulado – 2 cônsules eram eleitos a cada 5 anos pelos centuriões (inicialmente existiam 98 centúrias patrícias contra 95 plebéias, o que garantia a superioridade patrícia no poder executivo): presidiam o Senado, as assembléias e algumas atividades jurídicas;
Senado – autoridade patrícia permanente, tinha poder de veto, nomeava ditadores, decidia acerca da paz e da guerra e fiscalizava os magistrados e o consulado;
Magistrados: Pretores eram os funcionários da justíça; censores eram responsáveis pelo recenseamento da população e zelavam pelos costumes; edis detinham o poder de polícia , além de zelarem pelo patrimônio material; os questores eram responsáveis pelas finanças e pela arrecadação de impostos.
Assembléia Centuriata (ou Assembléia Popular)– elegia magistrados, cônsules e chegava a legislar. Nas assembléias plebéias era comum a prática do clientelismo, que favorecia os interesses patrícios.

A luta entre patrícios e plebeus:
A plebe romana tinha bons motivos para reivindicar maior participação política, direitos e melhorias sociais. Os plebeus compunham as centúrias (portanto, eram estratégicos na defesa da cidade) e movimentavam a economia, sendo que os mais abastados tocavam as manufaturas bélicas e navais. O plebeu mais pobre, por sua vez, estava sempre sujeito à escravidão, empobrecido pelas guerras e prejudicado pela ausência de leis escritas.
494 a.C. REVOLTA DA PLEBE – retirada para o Monte Sagrado torna a cidade vulnerável frente a exércitos estrangeiros. Os patrícios garantem a existência de um magistrado plebeu com direito a veto, o Tribuno da Plebe
450 a.C. LEI DAS DOZE TÁBUAS - garante a paridade jurídica entre patrícios e plebeus;
445 a.C. LEI CANULÉIA – permite o casamento entre patrícios e plebeus;
367 a.C. LEIS LICÍNIAS – limite para as propriedades rurais; estímulo ao emprego; garantia da eleição de um cônsul plebeu.
326 a.C FIM DA ESCRAVIDÃO POR DÍVIDAS.

Observação – todas essas conquistas não significaram o acesso à cidadania plena aos plebeus, já que o acesso à terra não foi garantido ao longo desse período de convulsões sociais. Os cargos políticos e os privilégios ficaram concentrados nas mãos da nobreza plebéia, que passou a desprezar o homem pobre da plebe da mesma maneira que agiria um elevado patrício.

A expansão imperialista
A fim de sanar a constante tensão entre patrícios e plebeus, o Senado romano investiu no projeto expansionista de conquista territorial iniciado timidamente no fim do século VI a.C. A expectativa de conquistar o acesso à terra unia plebeus e patrícios num mesmo ideal: o fortalecimento militar de Roma na Península Itálica.
Apesar da vantagem estratégica alcançada por Roma através da construção de estradas (“Todos os caminhos levam à Roma”), não tardou para que os italiotas encontrassem um inimigo à altura: os fenícios de Cartago.

Guerras Púnicas: Roma x Cartago

ROMA E CARTAGO: UM CONFRONTO DECISIVO
A tradição clássica atribui a Dido, filha de um rei de Tiro, a fundação da colônia fenícia de Cartago, por volta do século IX a.C. Situada na costa norte da África, a colônia recebeu o nome de Kart-hadashi (cidade nova). Os gregos transformaram esse nome em Karchedon, e os romanos, em Cartago.
Enquanto Tiro, Sidon e outras importantes cidades fenícias localizadas na costa do atual Líbano entravam em decadência, Cartago crescia em poder e esplendor, baseando sua prosperidade no comércio. No século VI a.C. quase toda a costa africana, da Cirenaica a Gibraltar, e a península Ibérica, rica em ouro, prata, ferro e cobre, estavam sob o domínio dos cartagineses. Estes também haviam se apoderado das ilhas Baleares, da Sardenha, da Córsega, de metade da costa oeste da Sicília e de Malta, ilha do Mediterrâneo central. Cartago impunha aos territórios conquistados o pagamento de grandes tributos anuais, obrigava os vencidos a se alistarem no seu exército e controlava-lhes rigorosamente o comércio exterior. Em troca, oferecia proteção militar, garantia a independência do governo local e a estabilidade econômica. O Comércio e a exploração desse império tornaram Cartago, no século III a.C., o mais rico e poderoso Estado mediterrâneo.
As relações entre Roma e Cartago iniciaram-se em 510 a.C., com um tratado pelo qual Roma reconhecia a Cartago o direito de comerciar e piratear em todo o Mediterrâneo ocidental, desde que não invadisse o mar Tirreno ou atacasse qualquer das cidades latinas aliadas aos romanos. Esse tratado foi renovado em 348 a.C., mas, no século seguinte, Roma, senhora da península Itálica, começou a ambicionar a Sicília, que era grande produtora de trigo e ponto estratégico para o controle do tráfego comercial e militar no mar Mediterrâneo.

A guerra no mar
Na Primeira Guerra Púnica, Roma era uma potência terrestre desafiando Cartago, uma potência marítima. A guerra só poderia ser ganha se Cartago fosse derrotada em seu próprio elemento.
Nos combates navais da época, as embarcações, movidas com a maior velocidade possível por meio de remadores, eram lançadas contra os flancos dos navios adversários. Como a ponta da quilha era equipada com um esporão metálico, o resultado era um buraco na lateral do navio inimigo, abaixo da linha-d’água, o que causava o seu afundamento. Os cartagineses pareciam imbatíveis no mar. Seus remadores eram mais rápidos e os marinheiros podiam frear brusca-mente a embarcação, mudar a sua direção de modo a defendê-la do esporão inimigo e efetuar outras manobras.
Em 241 a.C:., Roma construiu, em sessenta dias, uma esquadra de duzentos quinqüerremes. Baseados no modelo cartaginês, mediam 40 m de comprimento e abrigavam uma tripulação de duzentos homens armados. Tinham, porém, uma inovação: o “corvo”, espécie de ponte levadiça que caía sobre a nave inimiga, transformando-se numa passarela. Os soldados podiam, assim, passar ao navio adversário e fazer do combate naval um combate semelhante ao terrestre, no qual eram peritos. Criado pelo cônsul Caio Dílio, o “corvo” assegurou aos romanos a vitória em Melazzo.

PRIMEIRA GUERRA PÚNICA (264-241 a. C.)
264 a.C. – Os romanos tomam, na Sicília, as cidades gregas aliadas de Cartago. Hierão de Siracusa alia-se a Roma e conquista a Sicília ocidental até Agrigento (261 a.C.).
260 a.C. – A frota romana derrota os cartagineses, chefiados por Aníbal, ao largo de Milazzo.
256 a.C. – Os romanos desembarcam na África, sob o comando de Atílio Régulo. No entanto, são derrotados pelas tropas cartaginesas chefiadas por Xantipo, mercenário espartano (255 a.C.).
250 a.C. – Roma conquista Panormo (Palerma) e renova aliança com Hierão.
249 a.C. – Alternância de vitórias e derrotas para ambos os lados.
241 a.C. – Roma derrota os cartagineses numa batalha naval realizada junto às Egades, pequenas ilhas situadas a oeste da Sicília. A paz é assinada. Cartago renuncia à Sicília, que se torna então a primeira província romana.

Acontecimentos posteriores
229-222 a.C. – Roma ocupa a Iliria (atual Iugoslávia). Na Itália, derrota os gauleses em Clastidium (Casteggio, Pavia) e ocupa uma de suas capitais: Mediolanum (Milão). Os romanos fundam, ao norte da Itália, as colônias de Piacenza, Modena e Bolonha.

SEGUNDA GUERRA PÚNICA
Antecedentes
237-231 a.C. – Pelo tratado de paz de 241 a.C., os cartagineses ficam obrigados a pagar por dez anos um tributo anual da ordem de 3 200 talentos. Amílcar Barca conquista territórios na Espanha (237 a.C.), e as minas de Serra Morena permitem o pagamento dos tributos devidos a Roma. Em 231 a.C. é assinado o Tratado de Ebro, pelo qual os romanos reconhecem o domínio cartaginês ao sul desse rio espanhol.
228-221 a.C. – Morte de Amílcar. Aníbal é o comandante supremo na Espanha.
219 a.C. – Aníbal conquista Sagunto, colônia grega do litoral sul da Espanha, aliada de Roma, o que equivale a uma declaração de guerra.

A Guerra (218-201 a.C.)
218 a.C. – A fim de surpreender os romanos, que se preparavam para combater na África, Aníbal entra na Itália, pelos Alpes, com 50 000 soldados, 9 000 cavaleiros e 37 elefantes. Em Trébia, os gauleses do vale do Pó aliam-se aos cartagineses. 217 a.C. – Comandados por Caio Flaminio, os romanos são derrotados pelos cartagineses junto ao lago de Trasimeno. Sob o comando de Cornélio Cipião, o Africano, retomam Sagunto na Espanha. 216 a.C. – Esmagados pelos cartagineses em Canas, os romanos perdem 50 000 de seus 80 000 soldados, entre eles o cônsul Paulo Emilio.
215 a.C. – Morte de Hierão de Siracusa. Seu sucessor alia-se a Cartago.
212 a.C. – Tomada de Tarento por Aníbal Barca. Na Sicília, a frota romana, comandada por Marco Antônio Marcelo, toma Siracusa. Em Capua os romanos são derrotados por Aníbal.
211 a.C. – Cipião conquista Cartagena. 208 a.C. – Asdrúbal Barca é vencido em Bácula por Cipião.
207 a.C. – Os romanos vencem os cartagineses numa importante batalha perto do rio Metauro (norte da Itália), durante a qual morre Asdrúbal Barca.
204 a.C. – Cipião desembarca na África e recebe apoio de Masinissa, rei da Numidia. Cartago chama Aníbal de volta à África para combater os romanos.
202 a.C. – Aníbal é derrotado em Zama, na batalha que põe fim à Segunda Guerra Púnica.

Acontecimentos posteriores
200-188 a.C. – Combatendo antigos inimigos, aliados de Cartago, as legiões romanas expandem seus domínios pela Itália do norte (190 a.C.), península Ibérica, Grécia e Macedônia (197 a.C.J. Em 196 a.C. Aníbal, eleito magistrado supremo de Cartago, propõe que o mandato dos juízes seja fixado em um ano, adota medidas para impedir as venalidades e liberta os cidadãos de taxas extras. Os oligarcas denunciam-no a Roma, sob a acusação de planejar o reinício das hostilidades. Em 195 a.C. Aníbal foge para Antioquia, depois para Creta e por fim para a Bitmia, onde se mata (183 a.C.). Em 188 a.C., ao derrotar Antíoco III da Síria, que governava também a Ásia Menor, Roma domina o Mediterrâneo oriental.

TERCEIRA GUERRA PÚNICA (149-146 a.C.)
Antecedentes
A paz, assinada em 201 a.C., impõe a Cartago desarmamento naval e terrestre, pesadas indenizações, renúncia a todas as possessões e perda de política independente. Além disso, Roma incita alguns de seus aliados africanos a guerrilhas contra Cartago e espera um pretexto para a completa destruição de sua rival.
Este surge em 151 a.C., quando Masinissa, rei da Numidia, aliada de Roma, pretende apoderar-se das costas da atual Tripolitânia, pertencentes a Cartago. Os cartagineses declaram guerra à Numidia (151-150 a. C.).
149 a.C. – O Senado romano alega que Cartago violara o tratado de paz e declara-lhe guerra. Os cartagineses concordam em entregar todas as suas armas aos romanos, mas, quando estes ordenam que eles se retirem da cidade, resolvem oferecer-lhes resistência.
146 a.C. – Cartago é destruída. Seu território torna-se então a província romana da África.
Obs – os excertos sobre as Guerras Púnica foram extraídos do site http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/



Conseqüências do Imperialismo Romano

• Aumento do número de escravos (prisioneiros de guerra) e conseqüente desemprego para os plebeus (aumento do clientelismo);
• Afluxo de riquezas, produtos agrícolas e manufaturados para Roma; conseqüente queda da produção na Península Itálica;
• Crescimento do comércio (Mediterrâneo = “Mare nostrum”)
• Terras conquistadas concentradas nas mãos patrícias → Soldados plebeus desertam → Vulnerabilidade aumenta junto com a tensão social.
• Decadência moral; valorização do ócio, da ostentação e do consumismo por parte da elite romana;
• Caos social decorrente da desigualdade → “Pão e circo” como solução.

Reformadores Os irmãos Graco

Ao ser eleito tribuno da plebe, em 133 a.C., Tibério Graco propôs o revigoramento da lei que impunha a devolução ao Estado das terras públicas, então em poder da aristocracia, e sua distribuição entre os cidadãos pobres. Com isso, pretendia resolver graves problemas interligados: excesso de escravos no campo, superpopulação e corrupção urbanas e decadência militar de Roma. A sugestão de Reforma agrária despertou forte reação do partido senatorial, representante dos interesses dos grandes proprietários. No final do ano, ao tentar se reeleger, Tibério foi trucidado por seus adversários junto com seus adeptos.
Em 123 a.C., seu irmão Caio Graco retomou esse programa. Além de revigorar a lei agrária, propôs o fornecimento de roupas e armas aos cidadãos pobres às custas do Estado; a realização de obras públicas, que proporcionassem emprego a milhares de desocupados, e a lei do trigo (conhecida como Lei Frumentária), que autorizava o governo a distribuir o cereal pela metade do preço de mercado. Essa lei fez com que as massas pobres deixassem de ser clientes da aristocracia para se tornar defensoras dos Graco e de seus sucessores do partido popular, entre os quais Júlio César.
As leis de cidadania foram rejeitadas pelo Senado e, em 121 a.C., as tropas chefiadas pelo cônsul Lúcio Opímio tornaram de assalto o monte Aventino, onde os democráticos estavam entrincheirados. Caio Graco, para não se entregar, preferiu o suicídio. Três mil de seus seguidores foram executados sem processo algum.
Obs. – excerto extraído do site http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/

Ditadores

Mário - Cônsul popular, tentou retomar o programa dos Graco e reformou o exército que passara a ser mais fiel ao seu general que às instituições romanas.

Sila – General do partido senatorial, restringiu os poderes de magistrados e instituições plebéias.

Pompeu e Crasso
Entre 77 e 60 a.C., Pompeu e Crasso deram a Roma a segurança da invencibilidade do seu exército. Pompeu, conquistando territórios no Oriente: o Ponto, a Síria, a Cilícia, a Armênia, a Capadócia, a Galícia, a Cólquida e a Palestina; Crasso, esmagando, na Apúlia, em 71 a.C., a rebelião de 120 000 escravos liderados por Espártaco. De retorno a Roma, em 70 a.C., Crasso e Pompeu estabeleceram uma súbita aliança com os populares e ganharam a eleição para o consulado. Isso significou a reintegração dos poderes das assembléias e dos tribunos da plebe.
Obs – excerto extraído do site http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/

Pompeu e Crasso ainda tentaram colocar em prática a doação de terras aos soldados, medida rejeitada pelo Senado. Para manterem-se no poder, contaram com a ajuda de Júlio Cesar, general que na década de 50 a.C, tornar-se-ia liderança popular de grande carisma ao pacificar a Gália. Juntos, os três generais formaram Primeiro Triunvirato.

Primeiro Triunvirato – 60 a.C.
Júlio César – administrava a Gália
Crasso – administrava a porção oriental e o norte da África
Pompeu – administrava a Península Ibérica

53 a.C. – Crasso morre em combate na Pérsia.
52 a.C. – O Senado Romano, temendo a popularidade de Júlio César, proclama Pompeu Cônsul Único.
52 a.C. a 48 a.C. – Júlio César x Pompeu – “A sorte está lançada”
48 a.C. – Em fuga, Pompeu é assassinado e dá lugar às ambições de César, proclamado ditador vitalício.

Medidas tomadas por César:
 Implantação do projeto dos Irmãos Graco;
 Estímulo à colonização a fim de diminuir a tensão social;
 Concessão de cidadania aos povos itálicos;
 Obras públicas para gerar empregos;
 Distribuição de trigo as marginalizados:

Júlio César torna-se extremamente popular, mas suas medidas ferem diretamente os interesses do patriciado, que acusa o ditador de “Monarquista”. Na prática, Júlio César acumulara muito mais poderes que os antigos reis romanos, motivo pelo qual foi assassinado por conspiradores aristocratas (44 a.C).

Segundo Triunvirato - 44 a.C.

Lépido – administrava a porção africana do Império
Marco Antônio – administrava o Egito, a Grécia e o Ocidente
Otaviano – sobrinho de J. César – administraria a porção ocidental dos domínios romanos
Após uma série de incidentes envolvendo Otaviano e Marco Antônio, o segundo tenta passa a tratar os domínios sob sua tutela como propriedade particular. Tal postura torna-se evidente quando une-se com a Imperatriz do Egito, Cleópatra (32 a.C). Essa união comprometia a posse romana sobre o rico Oriente bem como o abastecimento de trigo dos domínios romanos (lembre-se que, neste contexto, o Egito era o celeiro do mundo e posse fundamental para a manutenção da política do “Pão e Circo”).

32 a.C. – Otaviano declara guerra a Marco Antônio e consegue apoio de todas as classes sociais com cidadania romana.
31 a. C. – Marco Antônio e Cleópatra suicidam-se.
29 a.C. – Otaviano retorna triunfante à Roma.
29 a 27 a.C – Otaviano:
 Restabelece a fortuna do patriciado;
 “Enxuga” o Senado (diminui o número de senadores);
 Adota medidas populares.
Obs – Fingindo querer se afastar do poder, Otaviano manobra as instituições romanas que, temendo a volta da anarquia militar conclama-o Augusto (Divino), dando início a uma nova etapa da história política de Roma:

O Império

Pax Romana – Otávio Augusto

►Postura defensiva para evitar rebeliões, invasões e levantes nas províncias dominadas:

· Muralhas

· Diminui o exército para evitar golpes

· Aumenta o número de jogos e feriados

· 27a.C →14d.C = Idade de Ouro

Crise do século III (Era Cristã)

§ Aumento dos gastos: Exército mercenário; Obras monumentais; Corte parasita;

§ Quebra do ritmo expansionista ; ↓ número de escravos ► Crise de mão-de-obra (Início);

§ Itália improdutiva, depende ainda mais de suas províncias ► crise produtiva; crises de desabastecimento (início);

§ Bárbaros incorporados às tropas regulares;

§ Estancamento da Receita ($);

§ Epidemias diminuem a população urbana (260 – 265);

§ Anarquia militar – sucessivos golpes de Estado protagonizados por Generais.

Século VI – “Morre e ri”

Mesmos problemas do século III potencializados:

· Insegurança nos centros urbanos → Patrícios retiram-se para propriedades fortificadas no campo; plebeus pobres buscam segurança e subsistências em troca de trabalho – Servidão ou COLONATO;

· Início de convívio incômodo com bárbaros Visigodos → empurrados pelos Unos tornam-se confederados indesejáveis;

Baixo Império

Crise do sistema escravista – decorrente do fim das guerras de conquistas, que também fizeram diminuir o afluxo de riquezas – implantação do colonato e da tetrarquia (284 - Diocleciano)!

Constantino buscou apoio dos cristãos através do Edito de Milão que determinou a liberdade de culto.

Unificou a doutrina cristã – 325 Credo de Nicea

Transferiu a capital para Constantinopla.

Teodósio dividiu o império em Império do Ocidente e Império do Oriente.

Invasões bárbaras.



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