segunda-feira, 1 de março de 2010

Primeiro resumo de Antiguidade Oriental



MESOPOTÂMIA “TERRA ENTRE RIOS”

Região do Oriente Médio – a Mesopotâmia – foi habitada desde o final da Idade da Pedra (quarto milênio antes de Cristo) por importantes civilizações (sumérios, babilônios e assírios, por exemplo). Atualmente, quase toda região pertence ao Iraque, enquanto as zonas periféricas se espalham pela Síria, pela Turquia e pelo Irã.
Essa região incrustada entre os rios Eufrates (a oeste) e Tigre (a leste) sempre foi disputada pelo potencial agrícola que oferecia no contexto de suas vazantes. Entretanto, para aproveitar tal potencialidade, fez-se necessária a organização de Estados mais ou menos centralizados, que organizassem a construção de diques e sistemas de drenagem e irrigação a fim de que seus habitantes pudessem se fixar, plantar e superar as intempéries da natureza (cheias e enchentes na primavera; secas no verão).
“Na Antiguidade, as zonas cultiváveis da Mesopotâmia e de suas vizinhanças se estendiam da foz do rio Nilo até a do Eufrates, formando uma meia-lua; por isso, aquela região passou a ser conhecida como “o Crescente Fértil”, que abrigaria imponentes cidades, sedes de próspera atividade comercial.” Cliohistória – Professor Almir Ribeiro.
As civilizações que ocuparam a Mesopotâmia possuíam algumas características em comum:
v    Poder político ligado à religião. Reis venerados como Deuses (Teocracia);
v    Clero extremamente privilegiado. Normalmente detinham o monopólio do conhecimento e da educação.
v    Economia predominantemente agrícola, sendo a terra propriedade de nobres (guerreiros) ligados ao poder real, de membros do clero, ou propriedade do Estado;
v    Trabalho predominantemente escravo, o que não excluiu a existência de trabalhadores livres ou em condição de servidão. Os escravos eram arregimentados entre prisioneiros de guerra ou pessoas endividadas;
v    Religião politeísta.
v    Sociedade desigual/estratificada.
OBS – Tais características também podem ser atribuídas (com certas ressalvas) à civilização egípcia, aos persas, e demais povos que habitaram o Crescente Fértil. Esse conjunto de características comuns recebe o nome de Modo de produção Asiático.

SUMÉRIOS (3500 a.C. a 2000 a.C.)
Primeiro povo a se fixar na Mesopotâmia. Ocuparam o sul da região entre rios, depois de derrotarem os nômades que a habitavam. Excelentes engenheiros, os sumérios destacaram-se por usarem a roda nos transportes e por terem inventado a escrita Cuneiforme (primeira de que se tem notícia). Ainda foram responsáveis pela drenagem de pântanos; irrigação de áreas áridas; pelas primeiras criações de peixes; pelas primeiras experiências em criação de gado em cativeiros; pelo primeiro calendário solar de que se tem notícia, o que nos leva a crer que dominavam a astronomia.
Economia baseada na agricultura, na pecuária e, mais tarde, no comércio.
Trabalhadores - Livres ou escravos de Guerra.
Organização política em Cidades-Estado: Eridu, Larsa, Nippur, Ur, Lagash. Lutavam constantemente entre si;
Chefe de Estado – Rei (monarquia teocrática) – equivalia a uma representação de algum Deus na terra.
Religião – Politeísta ligada a elementos da natureza. Os deuses eram antropomórficos (feições humanas). Anu era o deus do céu; Enlil, o deus do vento e das tempestades; Enki ou Ea, o deus da terra e da água e havia muitos outros deuses menores. Cada cidade tinha seu deus principal.
Arquitetura – destaque para os zigurates com estrutura de degraus.

ACÁDIOS ( 2350 a.C. a 2000 a.C.)
Povo semita do deserto sírio que se fixou no norte da Mesopotâmia (Akkad) e expandiu, gradualmente, seus domínios para o sul. Depois de constantes guerras contra os sumérios, fundaram o primeiro Império conhecido na História: o Império Acádio ou I Império mesopotâmico (fundado por Sargão I). Seus domínios se estendiam do mar Mediterrâneo (mar Superior) ao golfo Pérsico (mar Inferior).
O Estado era teocrático e a religião, politeísta.
Assimilaram grande parte da cultura suméria e foram derrotados pelos Cananeus.

AMORITAS OU BABILÔNICOS (1900 a.C. a 1600 a.C.)
Libertam-se do domínio acádio a partir da cidade de Babel e fundam o Império Babilônico.
Destaques
·                     1728 a.C Hamurabi  submete grande parte da mesopotâmia.
·                     Religião politeísta.
·                     Primeiro código de leis escritas – o Código de Hamurabipautado na pena de Talião: “olho por olho, dente por dente”. Dividia a sociedade em: Homens/os que se curvam (súditos livres)/e os que são propriedade (ESCRAVOS). Privilegiava os membros da elite.
·                     Comércio bastante desenvolvido.

HITITAS (1600 a.C. a 1200 a.C)
Originários da atual Turquia, destacaram-se pela utilização do ferro e pela domesticação de cavalos (o que os tornara invencíveis por longa data). Seu Império acabou submetido por um povo, até então subestimado – os assírios.

ASSÍRIOS (século XIX a.C. ao final do século VII a.C.)
Originários de região pouco fértil (norte da Babilônia), tinham constituição miscigenada e eram conhecidos pela crueldade com que tratavam seus inimigos .
Em 1200, submeteram os Hititas. Graças ao domínio do ferro e à vocação belicista, estenderam seus domínios por toda a Mesopotâmia. Sua força militar era extraordinária: empregavam carros de guerra, cavalaria e, a partir de 1200 a.C, armas de ferro.
Durante os séculos VIII e VII a. C., chegaram a conquistar a Pérsia e o Egito.
O auge de tal civilização foi alcançado no Reinado de Assurbanipal (668 a 626 a.C.), quando foi concluída a Biblioteca de Nínive. Vale lembrar que os povos dominados eram submetidos à servidão coletiva.
Em 612 a.C, foram derrotados por uma coalizão formada por persas e babilônicos.

CALDEUS - O Segundo Império Babilônico ou Império Neobabilônico (612 a.C a 539 a.C)
Apesar da duração efêmera, destacou-se pela conquista do Reino de Judá (Hebreus) e pelo “seqüestro” e escravidão a que submeteram tal povo (Cativeiro da Babilônia).  Vale destaque para o reinado de Nabucodonosor II, que expandiu substancialmente as fronteiras do Império.
Vale lembrar que os jardins suspensos da Babilônia, citados como uma das maravilhas do mundo antigo, teriam sido construídos neste contexto. Em 538 a.C, foram submetidos pelo Império Persa.



EGITO
A civilização egípcia desenvolveu-se graças ao regime de enchentes do Rio Nilo que anualmente transborda e fertiliza as margens; e quando “domado”, possibilita a agricultura numa região marcadamente árida.
Logo após o declínio da estrutura descentralizada formada por clãs (famílias) neolíticos (os Nomos), as famílias “vencedoras” estabeleceram dois reinos: Baixo (ao norte) e Alto Egito (ao sul).
3200 a.C. – o rei Menés, do Alto Egito, conquistou o baixo Egito e unificou os dois reinos. Menés foi o primeiro Faraó (proprietário de todo o reino), inaugurando um regime de governo Teocrático.
Neste primeiro contexto (de formação do Império), foram construídas as pirâmides Quéops, Quéfren e Miquerintos.   

O Antigo Império
Estendeu-se da III à VI dinastia (2686/2181 a.C.) e caracterizou-se pelo fortalecimento do poder central, pelo florescimento da vida econômica, baseada na agricultura, e pela criação de uma eficiente máquina administrativa.
Durante o século XXII a.C., devido a revoltas entre os nobres, rebeliões camponesas e invasões de povos estrangeiros, o Estado unitário deu lugar a uma série de Estados politicamente descentralizados.



O Médio Império
A unidade foi restaurada em 2160 a.C. pela IX dinastia. De 1991 a 1786 a.C. os agricultores saíram da servidão, os artesãos prosperaram e a influência dos sacerdotes foi contida. Construíram-se templos, pirâmides, canais e barragens; o comércio exterior intensificou-se e a Núbia (civilização africana localizada ao sul do Egito) foi conquistada. No fim da XII dinastia, o poder central foi novamente abalado por crises políticas internas.

O Novo Império
Durante o Segundo Período Intermediário, o Egito foi invadido e dominado pelos hicsos. Estes permaneceram no poder quase dois séculos, mas foram expulsos em 1580. Durante o Novo Império, o Egito se transformou na maior potência do mundo antigo, estendendo sua política imperialista até a Ásia. As regiões da Palestina e da Síria foram anexadas. Ouro e tributos afluíam em quantidade e o comércio prosperava. Mas o clero devoto a Amon-Rá (da capital Tebas) continuava a constituir uma ameaça para o poder central.
Um dos últimos faraós da XVIII dinastia, Amenófis IV, concebeu uma religião monoteísta (adorando o disco solar de Aton), na tentativa de dissolver a classe sacerdotal e destruir os templos. Mudou seu nome para Akhenaton e estabeleceu a capital em Tell-el-Amarna, casou-se com Nefertiti (que não era nobre). A reação dos sacerdotes de Amon, deus de Tebas, foi violenta e o conflito acabou levando ao poder (depois do reinado de Tutancâmon, genro de Amenófis-Akhenaton) os generais Horemeb e Ramsés. Este último inaugurou a XIX dinastia (1320 a.C.). Sucederam-se dois soberanos com o mesmo nome, sendo Ramsés III o último grande faraó da história egípcia.
As disputas entre clero e faraós acabaram por desintegrar a unidade territorial do Egito.
Depois de serem submetidos pelos assírios por 9 anos, os egípcios de Saís conseguiram expulsar os invasores e restabelecer a Unidade territorial (Renascimento Saíta). O contexto que se estende do século VI a.C. à Era Cristã foi marcado por novas invasões: Persas (525 a.C.); Macedônios (332 a.C.) e Romanos (30 a.C). 

Características
v    ECONOMIA – agrícola (o Egito era considerado o “celeiro do mundo antigo) até o século XX a.C., posteriormente o comércio e a produção artesanal ganham destaque;
v    POLÍTICA – teocracia; com destaque para os funcionários estatais – os escribas – que detinham grande poder econômico e político. Os Sacerdotes também dispunham de grande prestígio, além de serem possuidores de terras.
v     SOCIEDADE – Estamental (sem grandes possibilidades de ascensão social):
Faraó                                                               ►
Sacerdotes, guerreiros e altos funcionários ►

Felás (camponeses em servidão) e escravos ►


v    TRABALHO - servidão coletiva e escravidão a partir do expansionismo (prisioneiros de guerra).
v    RELIGIÃO
– Politeísta  -  contava com culto a deuses locais e veneração a animais.
- Antropozoomórfica – deuses híbridos Homem + animal.
- Crença na vida após a morte e na reencarnação, o que explica as mumificações.
v    FAMÍLIA – monogâmica
Destaques
Literatura – Escrita hieroglífica/hierática e demótica. Livro dos mortos.
Astronomia – utilizada para previsão do ciclo das águas.
Matemática – soma, subtração, divisão e concepção de sistema decimal sem o zero.
Medicina – especializados em anatomia (devido às mumificações), produziram as primeiras próteses de que se tem notícia, fizeram as primeiras cirurgias bem sucedidas.
Farmácia – Primeira farmacopéia da história/ conhecimento de inúmeras ervas medicinais.
Arquitetura – Funerária e religiosa (Pirâmides e monumentos); utilitária (diques e canais)
Arte – de caráter religioso funerário.
Química – Primeiros a utilizar sais como o Natrão para a conserva das múmias.

PERSAS
Vizinhos a leste da Mesopotâmia (atual Planalto do Irã), fortaleceram-se ao aliarem-se aos babilônicos na derrota dos assírios. Tiveram sua unificação empreendida por Ciro que, para ganhar a confiança dos conquistados, tratava-os com certa benevolência.
559 a.C -  anexam os territórios dos Medos e iniciam, em seguida, a conquista do Segundo Império Babilônico.
529 a.C. a 525 a.C. – conquistam o Egito.
521 a.C. – Dario I ascende ao poder com caráter divino (teocracia). Governa despoticamente e estimula o comércio, a cunhagem de moedas, e a formação de Províncias (as Satrápias comandadas pelos nobres de confiança do Imperador – os sátrapas. Esses, apesar dos privilégios de que dispunham, eram vigiados pelo serviço de inteligência do Imperador “os olhos e ouvidos do Rei”).
521 a.C. a 485 a.C. – Dario I estende domínios até a Índia.
Religião – Compilado pelo profeta Zaratustra, o livro Zend Avesta previa a luta constante e eterna entre o Bem e o Mal (dualismo):
Bem – Representado pela entidade Ahura Mazda ou Ormuz, cujo símbolo era o fogo e sempre estava associado à figura do Rei./Mal - Representado pela serpente.
Destaques - correio altamente eficiente; Grandes estradas pavimentadas.
Decadência – Ao disputarem o domínio de regiões mediterrâneas com os gregos, acabam derrotados (Guerras médicas – 490 a.C)
Têm seu território conquistado pelos Macedônios (Alexandre “o Grande”) no século IV a.C.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Biblioteca Digital Mundial

Chega de pesquisa tosca!!! Acessem! Dá para brincar o dia intero.


http://www.wdl.org/pt/


Excelente infográfico sobre modos de produção:  

http://www.educandus.com.br/abreAula.php?arqXML=aulas/daPreAteIdadeMedia/principal.xml

Calendários - texto complementar

Caros alunos, segue abaixo o endereço de um artigo acerca do histórico da formulação do calendário que seguimos. Assim que encontrar uma formulação de calendários mais "exóticos" (que eurocentrismo horroroso!!!), posto aqui para vocês. Abração!

http://educacao.uol.com.br/historia/ult1685u275.jhtm

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Textos excelentes sobre a origem do Homo sapiens

Segue abaixo uma série de endereços destinados ao estudo da origem do ser humano. A maioria é de publicações relacionadas a SBPC e, portanto, extremamente confiáveis. DIVIRTAM-SE:

http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=31&id=364

http://cienciahoje.uol.com.br/colunas/bilhoes-de-neuronios/assim-caminhou-a-humanidade/

E para aqueles "legais", que não leram nada, não estudaram NADA, coçam a tarde toda assistindo "sessão da tarde" (que nojo), mas insistem em polemizar com frases do tipo "se o nós evoluímos, por que os outros animais não evoluem?"; eis a resposta:

http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=31&id=362

http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=31&id=366

http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=31&id=363


E, de quebra, uma excelente atividade do maravilhoso


http://www.atividadeseducativas.com.br/index.php?lista=hist%F3ria


http://www.educandus.com.br/abreAula.php?arqXML=aulas/pre-historiaeorigemdospovos/principal.xml

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

AS CRUZADAS

Editado de postagem do site: http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/

Nos séculos XII e XIII, a Europa cristã empenhou-se numa vasta campanha contra o mundo muçulmano, para recuperar os lugares santos e assegurar o controle das rotas de peregrinação. Essas expedições bélicas, as cruzadas, contribuíram para o fomento do comércio e da navegação no Mediterrâneo e para a ascensão da burguesia na Europa.
No consenso geral, houve oito grandes cruzadas, empreendidas pelos reinos cristãos e quase sempre também pelo papado. Além dessas, registraram-se alguns movimentos de menor alcance, mas com as mesmas características das cruzadas.

ANTECEDENTES: Depois do ano 1000, ocorreu na Europa um crescimento demográfico, comercial e cultural que abalou os alicerces das instituições medievais. Todavia, o continente mantinha-se aferrado ao sistema feudal e as guerras proliferavam entre reinos e feudos, criando um clima geral de insegurança. No início da primeira cruzada, em fins do século XI, a Inglaterra ainda sofria as conseqüências da conquista normanda de 1066, a Espanha estava em pleno processo de Reconquista e a Alemanha enfrentava numerosas lutas internas e disputas com Roma. Por isso, esses três grandes países não participaram logo das cruzadas, cuja base principal foi a França.
Entretanto, todas essas nações passavam por processos sociais semelhantes. A expansão demográfica que começara no século anterior deixara desocupados muitos jovens da nobreza, que, não sendo primogênitos, se viam excluídos da herança de propriedades e, assim, eram tentados pela aventura. Por outro lado, a crescente atividade econômica impelia a Europa a disputar com o Islã o domínio do Mediterrâneo. Com a enorme concentração de poder nas mãos da igreja, o papado podia empreender grandes iniciativas de expansão religiosa. Todos esses fatores levaram a Europa a realizar uma série de custosas guerras santas contra o mundo muçulmano, que naquela época atravessava um período de grande instabilidade.
As tribos turcas, originárias do interior da Ásia, se haviam lançado à conquista do oeste, comprometendo o califado abássida de Bagdá no século XI. A veemência desse ímpeto produziria um choque multissecular com o Ocidente cristão.
O profundo sentimento religioso da cristandade medieval não teve paralelo. A devoção popular se traduzia em movimentos coletivos de crítica aos religiosos, que, por sua vez, exortavam os fiéis a acabar com os conflitos internos ou externos, ou a proteger a comunidade dos perigos dessas lutas. Tanto assim que as cruzadas tiveram uma de suas origens nas associações locais empenhadas em suprimir os conflitos feudais (trégua e paz de Deus) e em garantir a segurança dos peregrinos que viajavam para cidades européias de grande fé cristã, como Roma ou Santiago de Compostela. No Concílio de Clermont, em 1095, a proteção eclesiástica se estendeu aos peregrinos que viajavam para Jerusalém, e pela primeira vez lançou-se a idéia de uma campanha contra os infiéis. O ideal da cruzada, portanto, englobava ao mesmo tempo a aspiração de que a paz reinasse entre os cristãos e a exortação contra os muçulmanos, em cujas mãos se encontravam os lugares santos.
O espírito religioso da época fortaleceu-se com o temor generalizado do fim do mundo, provocado pelo início do segundo milênio.
Em fins do século XI, o império bizantino se ressentia dos violentos e crescentes golpes infligidos pelos novos conquistadores turcos. O imperador bizantino Aleixo I solicitou a ajuda da cristandade ocidental, que logo se dispôs a prestá-la.

PRIMEIRA CRUZADA

O Concílio de Clermont, inaugurado pelo papa Urbano II em novembro de 1095, incluiu entre suas decisões a de conceder o perdão de todos os pecados - isto é, a indulgência plena - aos que fossem ao Oriente para defender os peregrinos, cujas viagens tornavam-se cada vez mais perigosas. A repercussão popular da medida tornou-se patente quando o papa, ao anunciá-la, foi aclamado por uma multidão. Ao grito de "Deus o quer", que logo se propagou pela Europa, numerosos franceses de todas as camadas sociais vestiram um uniforme que ostentava uma grande cruz e que deu o nome aos guerreiros. O entusiasmo foi de tal ordem que muitos venderam ou hipotecaram todos os seus bens para obter as armas e o dinheiro necessários.
As camadas mais humildes da população criaram sua própria força, a chamada "cruzada do povo", que, formada em torno do pregador Pedro o Eremita, atravessou a Hungria e a Bulgária, provocando a sua passagem grandes abusos e desordens. Dizimados em parte pelos búlgaros, esses cruzados foram expulsos de Constantinopla em 1096 e acabaram sendo aniquilados pelos turcos. Outros grupos, sobretudo alemães, que se aproveitaram da expedição para massacrar judeus, sequer obtiveram permissão para atravessar as fronteiras bizantinas.
O imperador bizantino exigiu dos chefes militares estrangeiros que jurassem resgatar os territórios arrebatados ao império pelos turcos e que também lhe entregassem todas as novas terras conquistadas, com o que os cruzados concordaram.
Depois de conquistarem Nicéia e Antióquia, os cruzados rumaram para Jerusalém, que se achava nos domínios dos califas fatímidas do Cairo. O exército cristão ficara reduzido a cerca de 1.500 cavaleiros e 12.000 soldados, carentes de armas e provisões. Jerusalém foi conquistada três anos depois do começo da primeira cruzada a um custo jamais imaginado pela cristandade ocidental. A conquista foi seguida de um massacre de muçulmanos e judeus -- homens, mulheres e crianças.
Balduíno foi proclamado rei de Jerusalém (novembro de 1100), inaugurando-se assim o primeiro dos reinos cristãos que se instalariam na Terra Santa em conseqüência das cruzadas. Também criaram-se os condados de Edessa e Trípoli e o principado de Antioquia.

Segunda cruzada

Os estados cristãos do Oriente foram continuamente fustigados pelos turcos e, quando estes tomaram Edessa em 1144, o papa Eugênio III achou que já era hora de empreender uma segunda cruzada e convocou-a por uma bula especial em 1145. Também dessa vez a França apoiou ativamente o projeto, do qual participaram seu rei, Luís VII, e o imperador alemão, Conrado III, junto com Frederico da Suábia, herdeiro do império germânico, e os reis da Polônia e da Boêmia.
Em março de 1148, os franceses chegaram à Antioquia e pouco depois dirigiram-se para Jerusalém, onde decidiram atacar Damasco com seus cinqüenta mil soldados. A iniciativa fracassou em 28 de julho de 1148, quando, depois de cinco dias de assédio, ficou evidente que a cidade era inexpugnável. Ali terminou a segunda cruzada.

Terceira cruzada

Os 25 anos seguintes foram para os estados cristãos do Oriente uma época de graves perigos e lutas intestinas. Nesse período, tais estados também se desenvolveram muito. No século XIII redigiu-se o código denominado Assises de Jérusalem (Fundamentos do Reino de Jerusalém), que estabelecia o sistema feudal na região. Duas ordens militares cristãs, a dos cavaleiros de São João de Jerusalém e a dos templários, aumentaram seu poderio nesses reinos. A igreja ficou completamente latinizada, e consolidou-se uma população oriunda de quase todos os países da Europa.
As disputas entre os estados cruzados e a ameaça do sultão Saladino, que se apoderou de Jerusalém em outubro de 1187, levaram o papa Gregório VIII a lançar outra cruzada, à qual imediatamente se associaram o rei Guilherme II da Sicília, o imperador alemão Frederico I Barba-Roxa, os reis Filipe Augusto II da França e Henrique II da Inglaterra, que morreu pouco depois, sendo substituído por Ricardo I Coração de Leão. O rei francês alcançou Acre em abril de 1191 e em junho chegou Ricardo. Decorrido um mês de assédio, os cruzados tomaram a praça. Filipe voltou à França e Ricardo seguiu para Jerusalém. Ainda em 1191, em Arsuf, derrotou as forças muçulmanas e ocupou novamente Jaffa. Ricardo retornou à Europa sem jamais haver entrado na cidade santa. Com isso terminou a terceira cruzada, que, embora não tenha conseguido recuperar Jerusalém, consolidou os estados cristãos do Oriente.

Quarta cruzada

O impulso para o quarto movimento cruzado veio do papa Inocêncio III, que desde 1198 exortava a cristandade a empreender uma nova expedição. O pedido do papa repercutiu muito entre os nobres. Decidiu-se que o transporte dos exércitos ficaria a cargo de Veneza, cujas relações com Constantinopla eram das mais tensas. O ressentimento dos bizantinos contra os privilégios comerciais de que a cidade italiana desfrutava no império já resultara num massacre de venezianos em 1182.
Esse conflito acabou mudando os rumos da quarta cruzada. O objetivo do papa era destruir a potência islâmica do Egito; mas para Veneza, que mantinha boas relações comerciais com esse país, tratava-se de conquistar Constantinopla. Assim, constatado que o exército cruzado não dispunha de recursos para pagar pela travessia, as autoridades venezianas negociaram com os cruzados para que estes as ajudassem a conquistar a cidade cristã de Zara (Império Bizantino), na costa da Dalmácia, o que foi aceito. Zara caiu em novembro de 1202, apesar dos protestos do papa. A cruzada se tornara uma simples guerra secular.
Em 13 de abril de 1204, os cruzados entraram na capital (Constantinopla), que sofreu três dias de pilhagens e massacres. Em seguida, os cruzados dividiram entre si os despojos do império. Estabeleceram-se um reino bizantino em Epiro e diversos principados latinos na Grécia, como o ducado de Atenas e o principado de Moréia.

Quinta cruzada

O papa Honório III conseguiu, durante o IV Concílio de Latrão, em 1215, adesões para uma nova expedição.
Em fevereiro de 1219, os muçulmanos negociaram uma paz que incluía a cessão da própria Jerusalém aos cristãos. Pelágio (cardeal do clero católico) preferiu rejeitar a excelente oferta, pois estava certo de que os muçulmanos não poderiam resistir aos cruzados, quando Frederico II chegasse. Damietta caiu em novembro de 1219, mas o atraso das tropas alemãs estancou o avanço dos cruzados. Em julho de 1221, o cardeal ordenou uma ofensiva contra o Cairo que fracassou e, depois, teve de aceitar uma trégua de oito anos. Essa foi a última cruzada para a qual o papado mandou suas próprias tropas.

Sexta cruzada

O imperador Frederico II iniciou a sexta cruzada em 1227. Depois que sua frota partiu, o imperador recebeu uma missão de paz do sultão do Egito, mas o papa Gregório IX excomungou-o por ele ter demorado a se engajar na luta. Finalmente, Frederico zarpou no verão de 1228; mas tanto em Chipre como em Acre suas pretensões foram baldadas, sobretudo em virtude de sua excomunhão. Apoiado apenas pelos cavaleiros teutônicos e por suas minguadas tropas, Frederico conseguiu, no entanto, selar um acordo vantajoso com os egípcios em 1229. O reino de Jerusalém recebia a cidade santa, Belém, e um corredor para o mar, e firmava-se uma trégua de dez anos. Frederico foi coroado rei de Jerusalém e, de volta à Europa, reconciliou-se com o papa em 1230.

Sétima cruzada

Expirados os dez anos da trégua, uma nova cruzada, com poucos homens e poucos recursos, liderada por Ricardo de Cornualha e Teobaldo IV de Champanhe, não pôde impedir que, em 1244, Jerusalém caísse nas mãos dos turcos. Mas no ano seguinte, quando o papa Inocêncio IV abriu o Concílio de Lyon, o rei da França, Luís IX, expressou o desejo de ajudar os cristãos do Oriente. Luís IX levou três anos para embarcar, mas o fez com um respeitável exército de 35.000 homens. A expedição chegou a Chipre em setembro de 1248, como escala para o Egito. Em junho de 1249, Damietta foi recuperada para os cristãos e a cidade do Cairo esteve a ponto de cair em fevereiro de 1250. Os muçulmanos lograram interceptar o envio de provisões destinadas aos cruzados e Luís, diante da fome e das enfermidades que afligiam sua tropa, resolveu bater em retirada, mas foi feito prisioneiro. Libertado em troca do pagamento de um resgate em maio de 1250, permaneceu no Oriente até 1254, quando conseguiu a entrega dos demais prisioneiros.

ÚLTIMAS CRUZADAS

Em 1265, os egípcios da dinastia mameluca tomaram Cesaréia, Haifa e Arsuf; em 1266, ocuparam a Galiléia e parte da Armênia e, em 1268, conquistaram Antioquia. O rei Luís IX lançou nova cruzada em 1270, que seria a oitava, mas não encontrou muito eco na Europa. Dessa vez, rumou para Túnis, mas a expedição acabou em tragédia: a peste ceifou o próprio rei e um de seus filhos, além de muitos cruzados.
Desde então os estados cristãos do Oriente ficaram à mercê do destino, pois extinguiu-se na Europa o espírito que tinha animado as cruzadas. Muitos fatores concorreram para esse desgaste. Os exércitos europeus tinham-se convertido em milícias profissionais e os cavaleiros encontravam nelas uma ocupação permanente, sem necessidade de recorrer a aventuras no exterior. Os recursos financeiros absorvidos pelas cruzadas achavam agora melhor emprego no próprio continente. A igreja, motriz principal dessas campanhas, perdera muito de seu prestígio e não ousava arriscar novas campanhas.
Os estados cristãos no Oriente foram-se extinguindo um após outro. O de Jerusalém se desintegrou com as lutas entre os nobres cristãos. Os castelos dos cruzados foram sucessivamente destruídos.
As ordens militares também abandonaram a Palestina e com elas desapareceram as únicas forças organizadas que se opunham ao Islã.
Os turcos já não encontraram obstáculos de monta para suprimir o império bizantino, quando finalmente caiu, em meados do século XV, se reduzira a um pálido reflexo do que fora.

SIGNIFICADO HISTÓRICO

Embora não significassem um triunfo militar, as cruzadas exerceram poderosa influência na Europa ocidental. A rude cultura do Ocidente enriqueceu-se pelo contato com a do Oriente; desenvolveu-se o conhecimento da ciência e da filosofia greco-islamita; e adquiriram-se novas técnicas de combate. Reunidos em grandes massas que falavam uma linguagem comum ou dialetos relacionados, os cruzados fizeram contato com diferentes culturas e línguas, estabelecendo-se lembranças e tradições comuns que alimentaram o nacionalismo crescente.
As cruzadas contribuíram para o enfraquecimento parcial do feudalismo. Muitos senhores morreram ou, endividados, empobreceram gradualmente; outros fixaram-se no Oriente, disto se aproveitando o poder real, sobretudo na França, para destruir a independência política dos senhores feudais.

SIGNIFICADO ECONÔMICO

Foram profundas as transformações econômicas que as cruzadas geraram. Passaram-se a cultivar novos produtos agrícolas, como o açafrão, o arroz e a cana-de-açúcar. Criaram-se novos instrumentos para a indústria e novos processos de fabricação de vidro e de tapetes. Com o estímulo ao comércio e à indústria, desenvolveram-se as cidades, onde predominava uma classe média hostil ao senhor feudal. Houve enorme expansão no comércio entre a Europa ocidental e a Ásia. Foram implantados o sistema bancário e o do crédito europeu, dando início ao capitalismo comercial. O Mediterrâneo, aberto às frotas européias, favoreceu a expansão mercantil, sobretudo de Gênova e de Veneza.

SIGNIFICADO ESPIRITUAL

Os contatos permanentes com o pensamento oriental despertaram muitas idéias heréticas na Europa ocidental. Em relação ao papado, as cruzadas provaram a incapacidade dos papas para dirigir a cristandade. É certo que elas satisfizeram o desejo de restaurar a comunhão dos cristãos do Oriente com Roma no plano espiritual, mas sua política deixou apenas uma herança amarga, que tornou o cisma irreparável.
Na realidade, as cruzadas detiveram por quatro séculos o que se julgava inevitável no século XI: a queda de Constantinopla. Muito mais que os acontecimentos do século XV, as cruzadas marcaram o início dos tempos modernos. Nelas, fase de transição, havia muito de medieval - a cavalaria, a ascendência da igreja, o feudalismo e a arte militar. Mas havia também muito de moderno - o comércio internacional, a interpenetração de culturas, a vida urbana, a pequena indústria.

A “CRUZADA DOS MENDIGOS”

Em março de 1096, 12 000 pessoas, entre elas mulheres acompanhando os maridos, crianças. velhos e camponeses desejosos de escapar à servidão feudal, levando ramos de palmeiras e cruzes, e acreditando poder derrubar os muros de Jerusalém apenas com a força da oração, partiram da França em direção à Terra Santa. Eram liderados por pregadores itinerantes como Pedro, o Eremita, e Gualtério, o Sem-Posses (Gauthier Sans-Avoir), e entre a turba só oito eram cavaleiros.
Essa multidão tinha pouquíssimas armas e quase nenhum mantimento. A marcha desordenada foi marcada por atol de pavorosa crueldade, dos quais foram vítimas muitos judeus (vistos como "inimigos de Cristo"); cidades cristãs foram saqueadas para obter alimentos; essas violências freqüentemente provocaram a reação armada dos governos das regiões por onde passavam os “cruzados”. Em julho de 1096, os viajantes alcançaram Constantinopla, onde o imperador de Bizâncio, Aleixo Comneno, aconselhou-os a não atravessarem o Estreito de Bósforo e a esperarem a expedição oficial, que só sairia da Europa em agosto. Foi inútil. A multidão prosseguiu até Nicéia, cidadela muçulmana, decidida a atacar. No entanto, foi suficiente a ação dos arqueiros turcos para fazer tombar a maior parte daqueles infelizes sonhadores.

1212 A “CRUZADA DAS CRIANÇAS”

O escândalo da Quarta Cruzada levou à crença de que só inocentes e devotas crianças poderiam libertar o Santo Sepulcro. Pregadores fanáticos convenceram os pais de 30 000 crianças a deixá-las partir desarmadas e sem suprimentos. Em Gênova encontraram capitães que as transportaram para o Egito e a Tunísia, em vez de para a Palestina; muitas foram vendidas como escravas; outras morreram e fome e doenças.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Resumão de Feudalismo

O FEUDALISMO - Adaptado de postagem do site: http://www.cliohistoria.hpg.ig.com.br/

A “HOMENAGEM”

Trata-se de uma cerimônia com muitos gestos e símbolos, como descreve o historiador Marc Bloch (1886-1944': “Eis dois homens frente a frente: um, que quer servir; o outro. que aceita. ou deseja ser chefe. O primeiro une na mãos e, assim juntas, coloca-as nas mãos do segundo: claro símbolo de submissão (...). Ao mesmo tempo, o personagem que oferece as mãos pronuncia algumas palavras, muito breves, pelas quais se reconhece ‘o homem’ de quem está na sua freme. Depois, chefe e subordinado beijam-se na boca: símbolo de acordo e amizade”.
A “homenagem" é assim o ato pelo qual um indivíduo passa a ser admitido como “o homem”. Esse indivíduo, porém, apesar de suas palavras, não é nenhum pobre miserável: é o comes, palavra latina que significa “companheiro”; é o companheiro de batalhas de um chefe guerreiro que se tornou rei. É, portanto, um influente do reino.
Mas o seu pecar não é nada diante do rei, cuja autoridade passou a ser considerada como um desígnio de Deus. Pela vontade divina, o rei é o senhor todo-poderoso, o único proprietário legitimo de todo o reino. Ninguém é nada sem o seu consentimento e proteção.
É por isso que o comes deve reconhecer-se como um indivíduo que nada possui, e que precisa, conseqüentemente, da proteção do rei. Em troca, ele deve servir ao rei, ser-lhe fiel. Só então pode se tornar "o homem”, mas na qualidade de "homem do rei", que irá permanecer à sua disposição até a morte. Geralmente, o "homem do rei" era também denominado vassalo – palavra de origem celta que significava, no inicio, "escravo doméstico". Com o tempo porém, ser vassalo tornou-se um símbolo de honra, prestigio, poder e riqueza.
De fato, o vassalo, em troca da fidelidade e de serviços, recebia do rei uma série de vantagens (os '‘benefícios’'), principalmente o direito de posse e de administração de uma parte do reino. Tal porção de território denominava-se feudo, palavra derivada do termo românico fief (ou feu, em provençal), que por sua vez veio do germânico Vieh.
O vassalo tornava-se assim feudatário e, na homenagem, recebia alguns objetos chamados "investiduras”: desde um bastonete representando os benefícios, até uma porção de terra simbolizando o feudo, um ramo de planta verde para tornar a terra fecunda e produtiva,, uma bandeira como sinal de união entre o rei e o vassalo, e uma espada como símbolo do poder do feudatário sobre o feudo, mas também do dever do vassalo de auxiliar o rei com suas armas.

A RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA

O juramento do vassalo, que citamos na abertura, é um dos mais antigos que se conhece. Do século X ao XII – período em que o sistema de vassalagem atingiu uma forma mais acabada –, a formula do juramento bem como os direitos e os deveres do rei e do vassalo ficariam mais complexas. Apesar disso, o essencial do sistema permaneceu imutável, tendo como base dois pontos:
1) A existência de um “poderoso", que necessita de homens fiéis que o auxiliem na administração das terras e das riquezas do reino, e que organizem o exército nos tempos de guerra.
2) A existência, por outro lado, de pessoas dotadas de menos poder, e que, por isso, requerem proteção e auxilio de alguém mais poderoso. Em troca da fidelidade e de serviços, esses “homens do rei” recebem benefícios (como o feudo) e privilégios, como as “imunidades” (isenção de impostos), e os direitos de cobrar taxas de seus subordinados, de criar leis para o seu feudo, de recrutar soldados etc.
Em suma, a organização social que caracterizava o feudalismo baseava-se em relações pessoais de dependência e de ajuda recíprocas, como método de controlar e governar vastos territórios.
Mas por que surgiu na Europa um tal modo de organização da sociedade, exatamente pouco depois da fundação, no final do século VIII, do império Carolíngio, por Carlos Magno? Por que esse rei e seus sucessores, que detinham em suas mãos o domínio de grande parte da Europa, não reservaram para si todo o governo do reino?
Na realidade, esse grande território era praticamente ingovernável: as guerras eram constantes e, além disso,a Europa passava por contínuas invasões de povos guerreiros (os vikings, ao norte, os húngaros, a leste, e os árabes, ao sul).Nessas condições, Carlos Magno, do mesmo modo que os seus antecessores merovingios, só podia governar confiando parte da administração a condes, marqueses e duques, readaptando formas de dependência pessoal que já faziam parte da tradição dos povos bárbaros (como os francos e os germanos) ou das instituições romanas.
O feudalismo foi, assim, se consolidando aos poucos, não como resultado de um plano político, mas a partir de respostas imediatas a problemas e dificuldades de cada momento. Em conseqüência, o poder e a autoridade do rei foram se enfraquecendo em proveito dos feudatários, provocando na prática a divisão do reino em vários territórios autônomos e independentes entre si.

A COMPLEXA REDE DE RELAÇÕES DE DEPENDÊNCIA

Carlos Magno, coroado imperador em 800, morreu em 814. O último imperador da dinastia carolíngia foi Carlos, o Gordo, deposto em 887. Durante esse período, o feudalismo foi adquirindo a sua forma, e uma grande parte da Europa passou a se constituir de incontáveis feudos, dos quais os maiores dariam origem aos Estados nacionais modernos.

O “REINO” DENTRO DO REINO

O feudo era composto pelo território que o vassalo obtinha do soberano. O feudatário administrava, mas não era proprietário. Em outras palavras, ele apenas detinha o usufruto do feudo: o seu direito restringia-se ao uso dos frutos daquele território, isto é, os produtos da terra e os bens oriundos de impostos e de serviços de seus subordinados. O proprietário continuava sendo o longínquo soberano, que retomava o feudo quando da morte do feudatário.
Na prática, porém, o filho do falecido feudatário renovava o juramento de fidelidade ao rei e prosseguia a administração do pai. Em outras palavras, o feudo era praticamente hereditário. Na verdade, o rei, nessas condições, quase não tinha controle sobre os feudos. Desde que o feudatário não rompesse a fidelidade ao rei, poderia governar o feudo como se este fosse seu "reino" e ele mesmo, um "rei”.
Sendo uma espécie de rei no seu feudo, o feudatário podia selar acordos de fidelidade e auxílio recíprocos com outras pessoas menos poderosas do que ele. O feudatário, de fato, também precisava de auxílio para administrar o seu feudo, e isto o levava a recrutar seus “homens” por meio de uma cerimônia de homenagem com características idênticas àquela à qual ele havia se submetido. Nesse caso, o feudatário, que era um vassalo do rei, tornava-se, por sua vez, senhor de outros vassalos.
Esses “vassalos do vassalo” (vavasseurs, na região da Normandia), recebiam, em troca da sua fidelidade, parte do feudo do seu senhor a título de benefícios: um castelo, uma fortaleza vizinha a uma vila de agricultores, campos cultivados, ou até mesmo uma simples ponte ou estrada sobre as quais podiam cobrar taxas e tributos.
A complexa hierarquia do sistema de vassalagem, no entanto, não se esgotava nesse ponto: os "vassalos do vassalo” podiam também ter seus vassalos, a quem exigiam fidelidade em troca de benefícios e imunidades. Assim cada nobre era senhor ou vassalo de outro.
A sociedade feudal estava assim rigidamente organizada por uma extensa e intrincada rede de relações pessoais de dependência, baseadas em compromissos mútuos, onde cada indivíduo ocupava uma posição fixa. Cada um estava na dependência do seu senhor – até mesmo o rei: este era considerado vassalo de Deus, de quem teria recebido o reino e a autoridade em troca da fé.

AS CAMADAS DOMINADAS

Grandes feudatários, vassalos do vassalo ou modestos vassalos destes, compunham a camada dominante na sociedade feudal e pertenciam invariavelmente ou à nobreza ou ao clero. Os nobres eram poderosos porque sabiam manejar a espada e a lança; os membros do clero, porque detinham os segredos da palavra divina. Uns mais, outros menos, todos eles possuíam alguma parcela do poder e da autoridade.
Abaixo deles havia as camadas dominadas, formadas por pessoas pobres e sem nenhum poder, e que também viviam na estreita dependência do seu senhor.
Mas mesmo entre os membros dessas camadas baixas, havia uma certa hierarquia. Os homens livres eram os mais privilegiados. Os artesãos, por exemplo, que produziam artigos de ferro, couro, madeira, lã etc., eram protegidos pelos senhores, que lhes davam casa e oficina. Em troca, os artesãos deviam fornecer anualmente ao senhor uma determinada quantidade de seus produtos. Livres eram ainda os colonos, isto é, os agricultores que cultivavam as terras a eles destinadas pelo senhor, em troca da proteção. A obediência ao senhor traduzia-se também em uma série de obrigações: deviam entregar parte da produção da terra ao senhor; pagavam taxas que recaíam, por exemplo, sobre o uso do forno, da ponte etc.; e deviam executar alguns trabalhos gratuitos (consertos de estradas, construção de muralhas etc.), denominados corvéias. Em caso de guerra, além de serem obrigados a assistir seu senhor, os vassalos deveriam resgatá-la se ele caísse prisioneiro em luta. Na realidade, numa sociedade inteiramente marcada por obrigações mútuas, era muito difícil determinar quem era livre, mesmo porque as palavras que designavam as categorias sociais variavam muito conforme a época e o lugar. Além disso, os colonos, com o passar do tempo, acabaram se confundindo com os membros da camada mais baixa da sociedade feudal: os servos.

OS SERVOS DE GLEBA

As obrigações que ligavam o servo ao senhor não eram muito diferentes das do colono: parte da sua produção agrícola era destinada ao senhor; devia pagar taxas para a utilização de fornos, moinhos e tonéis; realizava trabalhos gratuitos (as corvéias); pagava impostos por pessoa; e ainda devia cultivar as terras que o senhor reservava para si.
Se não era escravo, (a palavra “servo” na origem significava “escravo”), era tido como “coisa do senhor”, o qual dispunha do seu corpo, do seu trabalho e de seus bens. Suas obrigações não provinham de um juramento, mas da sua condição: servo era servo de pai para filho. Em suma, os servos estavam presos à gleba (a terra) e ao seu senhor, a quem alimentavam com o suor do seu trabalho. Eram, portanto, os verdadeiros sustentáculos do feudalismo.

“Gregório, bispo, servo dos servos, para todos os arcebispos, bispos, duques e condes do Reino Teutônico. O rei Henrique, em súplicas constantes, se oferece para satisfazer em tudo a Deus e a São Pedro, prometendo-nos observar completa obediência para, assim, merecer a bênção apostólica. Por muito tempo discutimos o caso, e repreendemos o rei por intermédio de cada núncio que nos vinha solicitar o seu perdão. Finalmente, por sua vontade, ele [Henrique] acampou diante do nosso castelo, permaneceu três dias diante da porta de entrada, despojado de todo ornamento real, vestido miseravelmente. Estava descalço e coberto apenas por uma humilde veste de lã. Não se cansou de implorar a misericórdia apostólica, de tal forma que todos os habitantes do castelo se comoveram com suas preces. Por fim o acolhemos na graça da Comunhão e no seio da Santa Igreja.’’ Assim descreveu o papa Gregório VII o encontro com o imperador Henrique IV, que, excomungado por ele, fora a Canossa suplicar-lhe perdão. Esse episódio revela o enorme poder da Igreja na Idade Média.

A Igreja e o Império

Envolvendo o imperador Henrique IV e o papa Gregório VII, o incidente de Canossa ocorreu em janeiro de 1077 e foi o ápice de uma longa luta entre a Igreja e o Sacro Império Romano-Germânico.
No Concílio de Narbona (990), os bispos haviam decidido que a Igreja tinha o direito de impor sua disciplina a todos os cristãos, fossem estes clérigos (sacerdotes, frades, monges etc.) ou leigos (pessoas comuns, entre as quais se incluíam reis e senhores feudais).
Mas no século X a confusão na Europa era muito grande para que se pudesse compreender de imediato o significado revolucionário desse princípio: habituada a governar despoticamente, a nobreza feudal vivia num permanente estado de guerra, cujas maiores vítimas eram os servos da gleba. Diante disso, a Igreja – interessada em expandir seu próprio poder – assumiu a defesa dos servos e passou a exigir que os nobres cessassem o estado de guerra.
Primeiramente proibiu-se combater aos domingos, dia do Senhor. Depois, em 1038, o Concílio de Bourges estabeleceu que todo cristão a partir dos 15 anos era obrigado a aceitar a "Paz de Deus” e a ingressar numa milícia organizada pelos bispos e encarregada de impedir que se violasse essa paz.
Por volta de 1040, os bispos da província de Arles proclamaram a "Trégua de Deus”, pela qual a Igreja proibia que se combatesse de quarta-feira à noite a segunda-feira de manhã e em todos os dias santos. Na prática, sobravam apenas noventa dias do ano para guerrear. Essa tomada de posição contra os senhores feudais foi uma forma de reduzir a violência que se observava na Europa desde o esfacelamento do Império Carolíngio (século IX).

A CRISE NA IGREJA

Nem sempre, porém, as ordens dos bispos foram obedecidas, pois a Igreja estava saindo de um dos períodos mais negros e nebulosos da sua história.
Até o século VI, a Igreja gozara de enorme prestígio e grande poder espiritual. O papa era considerado, de fato, o sucessor do apóstolo Pedro e o representante de Jesus Cristo na Terra, ou seja, podia "abrir ou fechar as portas do Paraíso” a quem quisesse. Num mundo profundamente crente, como era a Europa nos primeiros séculos da Idade Média, isso tinha um enorme peso.
Ao longo do tempo, contudo, a Igreja acabou se tornando um verdadeiro Estado, senhora de grandes domínios territoriais. O processo iniciou-se no Império Germânico com Oto I, o Grande (século X), que decidiu apoiar-se nos clérigos para enfraquecer os poderosos senhores feudais. Assim, ao lado dos príncipes leigos, surgiram os príncipes-bispos, os bispos-condes, e assim por diante. Os dois poderes, espiritual e temporal – Igreja e Estado –, estavam indissoluvelmente unidos, mas o segundo dominava o primeiro. Coroado imperador do Sacro Império Romano-Germânico, Oto I estabelecera, em 962, com o seu Privilegium Otonianum, uma espécie de acordo pelo qual ele e seus sucessores se atribuíam o direito de eleger o sumo pontífice (o Papa).

O movimento reformador

Por essa época, os dois maiores problemas da Igreja diziam respeito ao nicolaismo (desregramento moral) e à simonia (comércio de privilégios sagrados). Além disso, quando um soberano investia um vassalo de um feudo eclesiástico (uma abadia ou igreja, por exemplo), confiava-lhe também a investidura religiosa, ou seja, tornava-o bispo ou abade. Ora, anteriormente, apenas o papa dispunha dessa prerrogativa.
Nessas condições as grandes famílias adquiriam bispados e abadias para seus filhos, que quase nunca estavam interessados nas atividades piedosas; ao contrário, os jovens clérigos-aristocratas viviam no luxo, guerreavam, tinham mulheres e dissipavam os bens da Igreja. Evidentemente, nem todos os religiosos concordavam com esse estado de coisas. Surgiram, assim, em vários pontos da Europa, movimentos que lutavam pela revitalização da vida eclesiástica, procurando combater as desmoralizantes práticas da aristocracia. O mais importante desses movimentos nasceu no início do século X, no mosteiro beneditino de Cluny, na França. Os monges pregavam o fortalecimento da disciplina, a obediência às regras da piedade e da castidade e a libertação dos conventos da dominação feudal.

A luta pelas investiduras

No século XI. a renovação monástica e o afrouxamento da tutela do poder temporal sobre a Igreja propiciaram ao papado um maior domínio espiritual, capaz de fazê-lo enfrentar a ordem política dos soberanos. Reanimada, a Igreja afirmava o próprio direito de impor a sua disciplina a todos os fiéis (inclusive o imperador); em contrapartida, o império pretendia continuar controlando a vida religiosa por meio da nomeação do pontífice e da investidura dos bispos. Na segunda metade do século XI o antagonismo estava declarado, desenrolando-se entre reis e papas a série de disputas que passou para a História como a “querela das investiduras”.
Com a morte de Henrique III, o Negro, em 1056, subiu ao trono do Império Germânico seu filho Henrique IV. Neste mesmo contexto, nobres do Império passaram a reivindicar maior independência em relação ao poder. Para piorar, em 1059, a Igreja desfechou seu primeiro grande ataque por intermédio de um decreto do papa Nicolau II. Vedando a intervenção do imperador, esse decreto determinava que a eleição do sumo pontífice devia ser de exclusiva competência dos cardeais (os mais autorizados entre os bispos). Além disso, os cristãos ficavam proibidos de receber cargos eclesiásticos das mãos de um leigo. Dessa forma, o imperador perdia o direito de investir quem quer que fosse em funções religiosas.
A tensão entre império e Igreja intensificou-se ainda mais quando Alexandre II foi eleito papa em 1061, com base nas novas normas e, portanto, sem o reconhecimento dos germânicos fiéis ao imperador. Consolidando sua posição como pontífice, Alexandre II estendeu a reforma de Cluny até a Germânia. Logo, numerosos mosteiros germânicos passaram a recusar qualquer intromissão dos grandes senhores, do imperador e mesmo dos bispos nomeados pelo rei.
Assumindo o governo da Igreja em 1073, Gregório VII condenou vigorosamente as investiduras de ofícios e benefícios eclesiásticos promovidos por leigos e, especialmente, pelo imperador. Em sua ofensiva, o novo papa chegou a proclamar a destituição de todos os clérigos investidos nessas condições.
Convencido de que competia ao papa a direção do mundo religioso, a ele cabendo a exclusividade de nomear bispos e abades, Gregório queria para o papado a ascendência sobre toda a cristandade e, portanto, também sobre o imperador. A Igreja tornava-se, assim. uma espécie de superpoder, colocado acima dos soberanos que reinavam na Europa.
Para Henrique IV (rei do Império germânico), abandonar a prerrogativa de nomeação dos dignitários eclesiásticos significava renunciar a um poder fundamental, no momento em que a maioria dos grandes senhores germânicos opunha-se ao fortalecimento do governo central. Decidido a não abrir mão do que julgava um direito adquirido, o imperador preferiu ignorar as medidas adotadas por Gregório.
Em 1075, o papa solicitou ao imperador que reintegrasse os bispos da Saxônia, destituídos de seus cargos por terem participado de uma longa rebelião (1070-75) contra o poder monárquico. Sentindo-se ameaçado, Henrique contra-atacou, nomeando um prelado hostil a Gregório para o bispado de Milão. Como era natural, o papa recusou-se a confirmar essa investidura. Em 1076, o imperador convocou os bispos alemães para um sínodo em Worms, induzindo-os a rejeitar a autoridade de Gregório VII como papa.

Uma rendição vantajosa

Em violenta reação, Gregório excomungou Henrique IV, e marchou para a Saxônia, onde esperava encontrar-se com os líderes da nobreza revoltada contra o imperador. Ao chegar a Canossa, contudo, deteve-se no castelo da condessa Matilde da Toscana, esposa de seu aliado Godofredo de Lorena.
Enquanto isso, tendo perdido o apoio dos bispos e sentindo-se ameaçado pela rebelião da Saxônia, Henrique decidiu submeter-se às imposições de Gregório. Em janeiro de l 077, no célebre encontro de Canossa, o imperador implorou durante três dias, com os pés nus sobre a neve, o perdão do papa. Concedido, finalmente, esse perdão acabaria resultando vantajoso para Henrique IV.
Na Alemanha, porém, a situação era crítica: levando a revolta às suas últimas conseqüências, a nobreza rebelde escolheu Rodolfo, duque da Suábia, para o cargo de imperador. Em 1080, Henrique marchou contra seus inimigos, enfrentando-os na batalha da Turíngia. Extremamente sangrenta, essa batalha provocou severas perdas em ambos os exércitos; mas a notícia que chegou a Roma dava a vitória às forças de Rodolfo. Acreditando-a verdadeira. o papa excomungou novamente Henrique IV.
Foi o quanto bastou para o imperador reunir o episcopado germânico e lombardo e decretar a deposição de Gregório VII. Para substituí-lo, foi eleito Gilberto, arcebispo de Ravena, que adotou o nome de Clemente III. A sorte passou então a sorrir para Henrique IV, que, derrotando sucessivamente as tropas de Rodolfo e da condessa Matilde, marchou para a Itália. Em março de 108 l, Henrique atravessou os Alpes. Em maio, chegava às portas de Roma. Pouco tempo antes, procurando reafirmar sua autoridade, Gregório declarara que "somente o papa pode ostentar insígnias imperiais (...). É-lhe permitido depor os imperadores (...). Sua sentença não pode ser reformada por ninguém (...). A Igreja Romana jamais errou e, conforme o testemunho da Escritura, jamais errará".
Mas era tarde demais. No começo de 1084, Henrique era senhor de Roma, enquanto Clemente assumia o papado no Palácio de Latrão. Refugiado no Castelo de Santo Angelo, Gregório VII aguardou a chegada de seu aliado, o normando Roberto Guiscardo, cujas forças derrotaram as de Henrique em maio do ano de 1084.

A guerra chega ao fim

Afastado o perigo, Gregório VII voltou a Roma, morrendo em 1084. Seus sucessores continuaram a “guerra” contra Henrique IV e a luta pelas investiduras prolongou-se até 1122. Nesse ano, o imperador Henrique V e o papa Calixto II firmaram a Concordata de Worms, pela qual o primeiro investiria seus feudatários como senhores, enquanto o segundo os investiria como bispos.

Durante o reinado de Carlos Magno, os árabes diziam que, no Mediterrâneo, os críticos seriam incapazes fazer flutuar uma tábua que fosse. No século XI, contudo, diversas cidades européias passaram a lançar ao mar navios que praticavam um comércio em escala cada vez maior. E esse era apenas um dos sinais das modificações sociais e políticas pelas quais a Europa passava.

A Europa depois do ano 1000

Nos séculos XVIII e XIX, diversos autores usaram a expressão Idade das Trevas para designar uma parte da Idade Média européia. Uns referiam-se ao período compreendido entre 476 e 800, em que não houve imperador no Ocidente; outros fixavam os limites entre os anos 500 e 1000, aproximadamente, que delimitaram uma época caracterizada por guerras freqüentes e pelo virtual desaparecimento da vida urbana.

NEM TANTO CONTRASTE

Os historiadores modernos, mais preocupados com a objetividade, rejeitam o conceito de Idade das Trevas, já que esse período encerra importantes formas de ordenamento político.
Em 800, Carlos Magno, o rei dos francos, recebeu do papa o título de imperador (do futuro Sacro Império Romano-Germânico); mesmo assim, a Europa estava fragmentada em numerosos reinos pequenos, e a maioria da população, constituída de camponeses, vivia uma economia de simples subsistência. Nominalmente, o imperador era o soberano, e os reis e príncipes, seus vassalos, dentro de ampla rede de obrigações. O poder político, porém, estava atomizado, fragmentado, e o único fator de integração era a Igreja.

UM NOVO CENTRO

A partir do ano 1000, foi-se firmando um novo centro econômico e político na Europa, mais ao norte que o antigo, concentrado na península Itálica. Desde fins do século IX, povos escandinavos haviam-se fixado na região que viria a ser o ducado francês da Normandia. Com o tempo, os normandos adotaram a religião cristã e a língua francesa. Em meados do século XI, a Normandia era o Estado com maior grau de centralização da Europa. Os normandos conquistaram o sul da Itália, a Inglaterra, o País de Gales, a Escócia e a Irlanda. Os duques normandos sistematizaram o feudalismo, empregando-o em benefício de um governo mais centralizado; fizeram aliança com o papado e aumentaram seu poderio ao ganhar controle sobre a administração da Igreja, ligando-se aos mosteiros, que exerciam grande influência sobre uma larga porção da Europa ocidental (no feudalismo, bispos e abades eram simultaneamente autoridades espirituais e temporais; o clero chegou a possuir um terço das terras européias).
Os normandos desenvolveram as técnicas da cavalaria e a construção de castelos; na base disso, porém, estava uma nova agricultura.

A conquista de novas terras

Já desde 850 vinha se processando o desbravamento sistemático de terras virgens na Europa, e, entre os anos 1000 e 1250, desenvolveu-se um cultivo agrícola intenso na planície entre o rio Loire, na França atual, e o Elba, no território da Tchecoslováquia e das duas Alemanhas.
No tempo do predomínio romano, essa região tinha sido uma área florestal pouco populosa. Existem registros da gradual criação ali de técnicas agrícolas melhoradas e adequadas a climas setentrionais, como o uso da charrua – arado com rodas pesadas –, da coalheira ao redor do pescoço dos animais para fixar tirantes, de enxadas e outro.implementos de ferro, em vez de madeira, da substituição do pilão pelo moinho acionado a roda-d’água. A reintrodução do sistema romano de rotação de culturas, sobretudo, contribuiu para a obtenção de melhores colheitas.

Sobe a produção, aumenta a população

A modificação das técnicas agrícolas operou uma renovação econômica e social de boa parte da Europa. A produção abundante era obtida com menos trabalho, e o senhor feudal não necessitava mais de um número tão grande de servos sujeitos à corvéia (obrigatoriedade de prestação de trabalho). Grande número de pessoas pôde ser dispensado de determinados serviços, ficando, porém, obrigadas a pagar ao senhor em produtos agrícolas ou mesmo em moeda.
Quando os filhos dos camponeses não podiam empregar-se nos campos de exploração paterna, partiam para tentar a sorte em outro lugar. Freqüentemente, o próprio senhor oferecia aos moços lotes de terras virgens para cultivar e, para atraí-los, dava-lhes instrumentos agrícolas, animais de tração e os meios necessários à sua instalação.
Com o crescimento da produção de alimentos, a fome, que pesava havia séculos sobre o mundo rural, diminuiu, fazendo baixar também o índice de mortalidade. É seguro dizer que, após o ano 1000, a população da Europa ocidental começou a crescer de modo regular. No século XII o desbravamento e a colonização de novas terras atingiram seu ápice.

O RENASCIMENTO DAS CIDADES

A melhora de rendimento do trabalho agrícola e o pagamento da corvéia em moeda ou alimentos resultaram em uma concentração de recursos nas mãos das classes abastadas. Rapidamente, os senhores feudais foram tentados ao consumo de outros bens, além dos gêneros de primeira necessidade.
Ao mesmo tempo, um número crescente de camponeses que podiam desligar-se da terra dedicava-se ao comércio ou ao artesanato, satisfazendo a demanda de novos artigos criada pelas classes superiores. Não produzindo alimentos, esses comerciantes e artesãos,por sua vez, precisavam comprá-los. No início trocava-se mercadoria por mercadoria, mas, aos poucos, o dinheiro assumiu uma importância cada vez maior, até se tornar indispensável nas transações.

As peregrinações

Apesar do estado precário dos caminhos, que só permitiam um deslocamento moroso, após o ano 1000 as populações européias começaram a viajar. Religiosos, homens e mulheres, empreendiam longas viagens para as quais o pretexto era quase sempre a visita a certos locais sagrados (Santiago de Compostela, na Galiza, Roma, Jerusalém).
Esses peregrinos não levavam provisões para a viagem inteira, mas dinheiro para pagar refeições e hospedagem ao longo do caminho. Com o tempo, aumentou o número de padeiros, açougueiros, estalajadeiros e camponeses que se estabeleciam no itinerário desses viajantes.
O incremento do tráfego de pessoas pelas estradas acarretou a circulação de mercadorias. Os camponeses vendiam aos viajantes o excedente de suas colheitas e essa foi uma das formas pelas quais o dinheiro penetrou no meio rural. Naturalmente o maior beneficiado era o feudatário, que exigia do pequeno agricultor pagamento das suas obrigações em moeda. O clero, sobretudo a partir do final do século XI, aproveitou-se dos lucros para construir novas igrejas e embelezar os santuários; a aristocracia elevou suas exigências de consumo.

O luxo penetra nos castelos

Os nobres acostumaram-se rapidamente ao luxo: à mesa, servindo iguarias raras; no vestuário, abandonando os tecidos rústicos em favor das sedas e peles; na decoração dos castelos, adquirindo objetos de adorno. Os artigos de luxo, na maioria, eram importados do Oriente, para onde o Ocidente exportava gêneros alimentícios. Paralelamente a esse comércio, cresciam a produção e a troca de alguns produtos dentro da própria Europa. Vinhos franceses eram importados pela Inglaterra e pela região flamenga (que correspondia a uma parte das atuais Holanda e Bélgica); tecidos franceses e flamengos eram exportados para outros lugares da Europa. Com a circulação do dinheiro, o comércio desenvolvia-se rápida e vigorosamente.
Na segunda metade do século XI, o tráfego de pessoas e mercadorias era tão intenso nas estradas da Europa que os castelões criaram impostos sobre as mercadorias transportadas pelos caminhos que atravessavam seus feudos.

Novos protagonistas: os mercadores

A partir do século XI, uma nova classe econômica impôs-se na sociedade medieval: a dos mercadores. Eles buscavam produtos nos locais onde eram oferecidos em boa quantidade e a preço favorável, transportando-os, depois, por via marítima, fluvial ou terrestre, até os mercados de consumo. Como sua atividade era altamente arriscada (podiam ser assaltados ou submetidos à arbitrariedade dos senhores feudais por cujas terras passavam), os mercadores geralmente uniam-se e deslocavam-se em caravanas.
Às vezes, alguns comerciantes associavam seu capital reunindo-se numa sociedade. De início, o grupo juntava-se para uma única viagem; depois, tornava-se estável. As sociedades permanentes, chamadas no norte da Europa de guildas e hansas, podiam congregar os grandes mercadores de uma determinada região, ou os transportadores e usuários de um mesmo rio, ou ainda os freqüentadores de um mesmo centro comercial. Tais associações realizavam viagens em datas prefixadas, seguiam um trajeto conhecido e encontravam-se com outros comerciantes autônomos ou pertencentes a outras sociedades nos entroncamentos dos principais itinerários, onde se efetuavam transações comerciais. Assim nasceram as feiras. Em troca de uma taxa paga ao senhor do território, este assegurava aos mercadores a proteção, a paz e a segurança necessárias à realização dos negócios.
Além da feira, surgiu outro ponto de encontro: as cidades, onde os mercadores criaram entrepostos para passar os meses de mau tempo à espera da estação das caravanas e das feiras. Assim, o incremento das atividades mercantis fez com que ressurgisse a vida urbana.

Nascem os burgos

Originariamente o castelo era apenas a habitação do senhor feudal, sua família e agregados. No decorrer do tempo, porém, tornou-se burgo, ou seja, passou a centralizar todas as atividades coletivas essenciais. Ali se encontravam os moinhos de trigo, os fornos para assar pão, as granjas, os armazéns, uma capela e até mesmo uma guarnição encarregada da defesa da comunidade.
A cidade medieval cresceu a partir dos burgos, nas vizinhanças de abadias e mosteiros, sedes de romarias periódicas, que atraíam um grande número de viajantes, ou sobre as ruínas de antigas cidades romanas fundadas no passado em virtude da posição estratégica e/ou da facilidade de comunicação. Qualquer que fosse o ponto de partida, a cidade desenvolvia-se sempre em locais bem definidos e com intenso trânsito de pessoas.
De modo geral, o novo núcleo urbano organizava-se em torno de uma praça, onde, a cada semana, se faziam as transações comerciais. As ruas que conduziam a esse espaço amplo eram estreitas e tortuosas. As casas quase sempre tinham uma loja no pavimento térreo, na qual os artesãos, egressos do meio rural, produziam e vendiam seus produtos.
A população das cidades tinha origens diversas: uma parte, por exemplo, constituía-se de mercadores que ali resolveram instalar seus negócios; a maioria, porém, era oriunda do núcleo primitivo – o castelo e seus arredores –, antigos camponeses que abandonaram a agricultura atraídos pelas vantagens do comércio ou artesanato. Qualquer que fosse a sua procedência, todos se confundiam na mesma classe social – a burguesia –, que passou a adquirir forma incipiente a partir de meados do século XI.